Número de crimes violentos cometidos por adolescentes aumentou desde a pandemia. Islamismo e extremismo de direita atraem jovens, e a radicalização muitas vezes ocorre nas redes sociais.O alvo dos dois jovens de 15 e 17 anos, que se identificavam com a organização terrorista “Estado Islâmico”, era um mercado de Natal na cidade de Leverkusen, no oeste da Alemanha.

A intenção deles era matar o máximo de pessoas possível com um caminhão. Mas, dois dias antes da data planejada para o ataque, os adolescentes foram presos porque a polícia havia tomado conhecimento de suas conversas online.

Os menores – um originário do Afeganistão e o outro, da república autônoma russa da Tchechênia – foram condenados a quatro anos de prisão em 2024.

Casos como esse preocupam cada vez mais as autoridades de segurança alemãs. Há anos que o BKA, a agência federal de investigações da Alemanha, vem registrando um aumento acentuado nos crimes violentos. Entre os crimes cometidos por adolescentes de até 17 anos, o aumento foi de quase um terço desde 2019; nos crimes cometidos por crianças de até 13 anos, de até dois terços.

Guerra, mudança climática, pandemia

Segundo o próprio BKA, há indícios de que o estresse psicológico entre crianças e adolescentes vem aumentando há vários anos. “Embora o estresse psicológico não seja uma causa direta do comportamento criminoso, em combinação com outros fatores adversos, pode aumentar a probabilidade de cometimento de crimes (violentos)”, afirma a agência em seu mais recente relatório.

Entre os principais fatores adversos estão a violência doméstica, a falta de afeto parental, a pobreza e ansiedade em relação ao futuro diante de múltiplas crises sociais, como guerras, a mudança climática e a pandemia de covid-19.

O BKA considera especialmente vulneráveis os menores que fugiram de seus países de origem. Sozinhos e sem perspectivas num país estrangeiro, eles buscam na internet as respostas para suas questões sobre o sentido da vida. E assim muitas vezes acabam em sites de extremistas religiosos ou políticos, o que eleva a probabilidade de que eles também se tornem extremistas.

Comunicação com os jovens

Há mais de 20 anos, a ONG berlinense Violence Prevention Network (VPN) trabalha com esses indivíduos, incluindo crianças, adolescentes e jovens adultos. A entidade é uma importante parceira das autoridades de segurança para a desradicalização dessas pessoas.

O diretor-geral da VPN, Thomas Mücke, alerta para a crescente falta de comunicação com crianças e adolescentes na Alemanha. Ele sabe, por meio de oficinas sobre o Oriente Médio realizadas em escolas, como situações tensas podem surgir rapidamente. Por isso considera essencial que os jovens conversem entre si num ambiente em que se sintam à vontade. “Aí eles podem dizer uns aos outros o que os adultos não conseguem dizer para eles”, enfatiza Mücke. Assim é possível apresentar a eles perspectivas diferentes.

“Se perdermos essa capacidade de nos comunicarmos com eles, os extremistas terão vencido.”

Bolhas virtuais de radicalização

As possíveis consequências da falta de comunicação estão delineadas no relatório de 2024 do Departamento Federal para a Proteção da Constituição (BfV), o serviço secreto interno da Alemanha.

“Nos últimos anos, observou-se que crimes violentos de extrema direita são frequentemente precedidos de uma radicalização online”, diz o documento.

Essa radicalização se dá não apenas por meio do consumo de propaganda e desinformação em plataformas como Instagram e TikTok, mas sobretudo por uma rede de contatos, muitas vezes internacional, com pessoas de ideias semelhantes em aplicativos de mensagem como o Telegram.

O BfV destaca ainda que as redes sociais criam um espaço virtual de fácil acesso para o estabelecimento de contatos para a manifestação de opiniões misantrópicas e violentas.

Segundo a VPN, tirar crianças e jovens radicalizados de dentro de suas bolhas virtuais é cada vez mais difícil, e é importante não rotular os jovens de imediato por causa de declarações questionáveis, mas abordar suas emoções.

Efeitos duradouros da pandemia

Conversas com menores radicalizados mostram que as consequências da pandemia de covid-19 continuam existindo, mesmo em 2025. Eles reclamam com frequência que ninguém se importou com eles durante a pandemia – nem em casa, nem na escola, relata a especialista da VPN Feride Aktas.

Esses jovens se sentem sozinhos mesmo num grupo e são suscetíveis a influências. “E então eles encontram conexões que podem levá-los ao extremismo de direita ou ao islamismo”, explica Aktas.

Mücke diz que o problema fundamental de muitos pais é a dificuldade de reconhecer o risco de radicalização de seus filhos . Isso torna ainda mais importante o contato com centros de aconselhamento, como o VPN, em caso de dúvida.

Baixa reincidência

A ONG afirma ter lidado com 431 casos de “perigo relevante” nos últimos dez anos. São pessoas que representam uma ameaça a si mesmas e aos outros, explica Mücke.

Segundo ele, 75 são “indivíduos de alto risco” à segurança pública. O mesmo vale para outros 65 jovens radicalizados que se uniram ao grupo terrorista “Estado Islâmico” e retornaram da Síria para a Alemanha.

Mücke mede o sucesso de seu trabalho de desradicalização pela taxa de reincidência. O resultado, diz, é muito encorajador: entre os 431 meninos e meninas com quem trabalhou, houve apenas dois casos de reincidência.