08/11/2025 - 7:02
O Muro de Berlim, que dividiu a capital alemã na Guerra Fria, caiu em 9 de novembro de 1989. Seus fragmentos se espalharam pelo mundo e decoram lugares inusitados. Cada um deles conta uma história.O Muro de Berlim foi por muitos anos o símbolo mundialmente famoso e temido da divisão da Alemanha. Por mais de 28 anos, ele separou Berlim Ocidental, que pertencia à República Federal da Alemanha (RFA), de Berlim Oriental, capital da extinta República Democrática Alemã (RDA), alinhada à também extinta União Soviética.
Sua construção começou em 1961 por ordem da liderança comunista da RDA, quando cerca de três milhões de pessoas já haviam fugido para o Ocidente para escapar da escassez, da falta de liberdade e da vigilância estatal.
Para não perder mais cidadãos, a RDA construiu um complexo sistema de barreiras e fortificações ao longo dos 155 quilômetros da fronteira, projetado para ser intransponível, embora cerca de 5 mil alemães orientais tenham conseguido escapar ao longo dos anos.
A barreira interrompeu quase todas as rotas de transporte e comunicação entre Berlim Oriental e Ocidental; postos de controle de fronteira como o famoso Checkpoint Charlie eram as poucas exceções.
O Muro revelou toda a brutalidade do regime da RDA. Entre 1961 e 1989, ao menos 140 pessoas foram mortas tentando atravessá-lo. Além de cerca de cem fugitivos, guardas de fronteira e civis inocentes também perderam suas vidas.
Muro de Berlim: primeiro odiado, depois cobiçado
O colapso do comunismo na Europa Oriental levou à queda do Muro em 9 de novembro de 1989. A Reunificação da Alemanha veio quase um ano depois. Hoje em dia, apenas alguns trechos do Muro ainda permanecem em Berlim. O mais longo é a famosa East Side Gallery, com seu 1,3 quilômetro de concreto pintado com grafites e obras de arte urbana. Há também o Memorial do Muro de Berlim.
Mas, naquela época, os berlinenses queriam se livrar da odiada barreira de concreto o mais rápido possível enquanto, ao mesmo tempo, pessoas, governos e instituições de todo o mundo queriam um pedaço do Muro.
Isso é especialmente verdade no caso dos EUA, que hoje têm mais pedaços do Muro de Berlim do que a própria Berlim, segundo estimativas da Fundação Federal para o Estudo da Ditadura do SED [Partido Socialista Unitário da Alemanha, que governava a RDA]. Seja em frente à sede da CIA em Langley ou em um banheiro masculino em Las Vegas, os fragmentos podem ser encontrados em todo o país.
“Como uma das potências vitoriosas, os EUA naturalmente desempenharam um papel importante na divisão da Alemanha”, explica Anna Kaminsky, diretora da Fundação para o Estudo da Ditadura do SED. “O Muro foi uma questão que quase todos os presidentes americanos abordaram em sua política externa. Era, por assim dizer, uma questão emocional para os EUA, especialmente para os soldados americanos estacionados em Berlim.”
Os segmentos do Muro também podem ser encontrados em outras partes do mundo – da Nova Zelândia à Islândia, da Indonésia ao Chile. A Fundação para o Estudo da Ditadura do SED contabiliza 57 países (excluindo a Alemanha) com ao menos um pedaço. Cada um tem uma história própria e é interpretado de maneira diferente. Por vezes, as peças foram adquiridas por indivíduos ou empresas, outras vezes pelo governo alemão ou pelo Senado de Berlim.
Segmentos do muro como memoriais
Na Coreia do Sul, país que sente uma ligação com a história alemã devido à sua própria divisão, há trechos do Muro de Berlim em seis locais diferentes, incluindo Dorasan, o ponto mais ao norte da rede ferroviária sul-coreana, na fronteira com a Coreia do Norte.
Nessa estação, o então presidente alemão Joachim Gauck, juntamente com representantes do governo sul-coreano, inaugurou em 2015 a chamada “Plataforma de Reunificação”, revelando um segmento do Muro e uma placa com o apelo “construam uma Coreia reunificada e ajudem o mundo a se tornar mais pacífico”. Uma citação de Gauck também foi inscrita no local: “Juntos por uma vida em liberdade”.
Esses trechos também parecem ter um significado especial em alguns países do antigo Bloco Oriental, onde servem como um monumento à democracia conquistada com muita luta. É o caso da Bulgária, onde o governo da cidade de Sófia solicitou um trecho do Muro ao Senado de Berlim em 2006.
O segmento está ao lado do memorial às vítimas do comunismo na Bulgária, acompanhado por duas inscrições em búlgaro e alemão: “Em 13 de agosto de 1961, um muro dividiu Berlim, a Alemanha e, consequentemente, a Europa e o mundo em dois. A Bulgária permaneceu presa a leste do Muro até 9 de novembro de 1989, quando o povo o derrubou. Este fragmento do Muro de Berlim é um presente dos berlinenses aos cidadãos de Sófia, como símbolo de uma Europa reunificada e como prova de que os búlgaros agora são livres.”
O trecho em Sófia tem um aspecto sombrio, assim como o próprio muro. Muitas outras seções, no entanto, foram pintadas ou cobertas com grafites após sua remoção, frequentemente com a boa intenção de adorná-las com símbolos de paz e amizade. Como resultado, se assemelham agora mais a elementos da cultura pop do que a vestígios de um outrora temido muro fronteiriço.
O artista francês Thierry Noir, que vive em Berlim, pintou grandes seções do Muro de Berlim Ocidental com suas figuras características mesmo antes de 9 de novembro de 1989, e mais tarde continuaria a deixar sua marca nos segmentos. A ex-modelo alemã Heidi Klum, apresentadora do reality show Germany’s Next Top Model, tem um trecho do Muro pintado por Noir no jardim de sua casa na Califórnia, presenteado por seu marido, que nasceu na Alemanha Oriental.
O controverso comércio de pedaços do Muro
Após a queda do Muro de Berlim, o então governo provisório da RDA contratou uma empresa estatal para vender os trechos restantes com o objetivo de obter lucro. Essa empresa, por sua vez, cooperou com uma agência de Berlim Ocidental. Juntos, decidiram pintar os segmentos para aumentar seu apelo e, consequentemente, seu preço de venda.
“Isso causou muitos protestos na época. O governo da RDA, juntamente com representantes do partido que construiu o Muro, onde tantas pessoas morreram, queria lucrar com sua venda”, diz Kaminsky. Pelo menos o dinheiro arrecadado com as vendas seria destinado a organizações de caridade. No entanto, empresas privadas também lucraram com o Muro.
Uma análise crítica deste tema pode ser vista em Trondheim, na Noruega. Lá, o artista Lars Ø. Ramberg criou uma escultura intitulada Realismo capitalista a pedido da cidade. Ele colocou a palavra em inglês sale (“promoção” ou “liquidação”) em um segmento do Muro.
Para o artista, o Muro de Berlim, como símbolo da conquista da liberdade, se tornou um exemplo da mercantilização de seu próprio valor simbólico. Ao comprar os segmentos do muro e criar a escultura, ele se posiciona como parte desse problema.
Nos últimos dez anos, a demanda por segmentos do muro caiu drasticamente. “A história mundial mudou, a política mundial é diferente”, diz Kaminsky. “O significado icônico do Muro diminuiu ao longo das décadas. Como símbolo, ele está cada vez mais se tornando irrelevante.”
Para muitos, isso não é exatamente ruim, já que, independente de quão colorido o muro for e onde estiver localizado, ele continuará sendo o símbolo de uma ditadura.
