31/10/2025 - 8:49
Em tom eleitoral, governos de direita elogiam operação policial mais letal da história recente do Brasil. Plano de apoio mútuo contra crime organizado confronta governo federal.Na esteira da megaoperação que deixou pelo menos 121 mortos em favelas do Rio de Janeiro, sete governos eestaduais acordaram a formação de um “Consórcio da Paz”, pelo qual deverão prestar apoio mútuo para combater o crime organizado.
A decisão resultou de uma reunião do Palácio da Guanabara, a sede oficial do governo fluminense, num gesto de apoio a Claudio Castro (PL-RJ) por seus aliados. A sua gestão encabeçará inicialmente o projeto, que faz contraposição aos planos do governo federal para a matéria da segurança pública.
Segundo ele, o objetivo é “o enfrentamento ao crime organizado, ao tráfico de armas e à criminalidade que ultrapassa fronteiras” por meio do “compartilhamento de experiências, soluções e ações”.
Alinhados politicamente à direita, os seis outros governos envolvidos são os de Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal. A intenção, entretanto, é que todos os estados eventualmente se juntem à iniciativa, segundo os governadores.
Propostas linha-dura
A colaboração deverá incluir a troca de informações de inteligência, o apoio financeiro, o compartilhamento de contingente policial e a compra consorciada de equipamentos. Não há clareza ainda sobre como estes objetivos serão operacionalizados.
Em tom de palanque eleitoral, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), se expressou também a favor de mudanças na legislação, incluindo a classificações de facções como “terroristas”, visando o endurecimento de penas.
Ele colocou ainda as forças de segurança paulistas à disposição dos vizinhos fluminenses, incluindo equipamentos como drones e helicópteros.
Outras mudanças legislativas defendidas no encontro foram a punição de empresas que falsificam e sonegam impostos e o aumento das penas para casos de homicídio contra agentes públicos, reportou o Estadão.
Em março de 2024, os sete governos do Sul e do Sudeste já haviam assinado um pacto para criar um gabinete comum de inteligência para a segurança pública. A iniciativa prevê medidas idênticas ou semelhantes à do “Consórcio da Paz”.
Elogios à Operação Contenção
Pressionado pela Justiça, parlamentares e entidades a explicar a alta letalidade da ação policial nos complexos do Alemão e da Penha, Castro considerou um sucesso a Operação Contenção, conduzida na terça-feira (27/10) pela polícia fluminense.
Um vídeo publicado nas redes sociais de Castro mostra os governadores do consórcio elogiando a ação e prestando “solidariedade” ao Palácio da Guanabara. Para Tarcísio, a operação foi realizada “com muita excelência”. Já segundo o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), tratou-se de “um exemplo para o país”.
“Quero dar os parabéns a todos que participaram dessa operação, que, eu tenho certeza, foi muito bem planejada, pelos resultados obtidos”, disse, por sua vez, governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Partido Novo). Segundo ele, a operação não deveria ser considerada a mais letal, mas, sim, a mais bem-sucedida da história recente do Brasil.
A Defensoria Pública do Rio afirma que o número de mortos pode chegar a 132, incluindo quatro policiais. A Organização das Nações Unidas (ONU) expressou extrema preocupação, pedindo investigações e uma reforma do policiamento.
“A longa lista de operações que resultam em muitas mortes, que afetam desproporcionalmente pessoas negras, levanta questões sobre a forma como essas incursões são conduzidas”, disse uma porta-voz do secretário-geral da organização, António Guterres.
Os governadores Tarcísio de Freitas, Ronaldo Caiado e Romeu Zema são cotados para disputar a Presidência da República contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano que vem.
Oposição ao governo federal
O “Consórcio da Paz” bate de frente com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Segurança Pública, enviada pelo governo federal ao Congresso. O objetivo do texto é integrar as esferas municipal, estadual e federal, colocando em prática um sistema único na área da segurança com financiamento estável e coleta de dados padronizada – à moda do Sistema Único de Saúde (SUS), argumenta o Planalto.
À União, caberia estabelecer diretrizes quanto a políticas públicas, enquanto órgãos de controle e transparência se encarregariam de apurações sobre a conduta de profissionais de segurança pública. Hoje, a Constituição de 1988 define que estas são atribuições dos estados.
Para os governadores críticos, a PEC tira autonomia das unidades federativas ao aumentar as prerrogativas federais, o que o governo federal refuta. “O único objetivo do governo federal é tirar dos governadores as diretrizes gerais da segurança pública”, disse Caiado na reunião do consórcio.
Nesta semana, o governo federal anunciou a formação de um escritório emergencial de combate ao crime organizado no Rio de Janeiro, com envolvimento da Polícia Federal e do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
O chefe da pasta, Ricardo Lewandowski, que viajou à cidade após a Operação Contenção, chamou a iniciativa de “embrião do que queremos implementar nos estados com a PEC da Segurança Pública”. Segundo ele, o escritório vai facilitar o diálogo entre União e governo estadual, desfazer amarras burocráticas e unir esforços das forças federais e estaduais.
(Com Agência Brasil, ots)