Município alemão investe em nova forma de utilizar construções abandonadas para evitar o impacto climático de demolir ou reformar.O setor de construção civil é majoritariamente responsável pela pegada de carbono da Alemanha. Além de responder por 40% das emissões de CO2, também produz mais da metade dos resíduos sólidos e consome 90% das matérias-primas minerais e não renováveis do país.

Isso coloca a construção civil no centro da discussão climática, entende o pesquisador Hans Joachim Schellnhuber, ex-diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático.

Além de os novos edifícios exercerem pressão sobre o meio ambiente, a reforma de construções existentes também consome recursos, aumenta a quantidade de resíduos e piora o aquecimento global.

O desperdício anual derivado da construção civil na Alemanha corresponde à quantidade de material necessária para construir 430 mil apartamentos, de acordo com levantamento da Fundação “Baukultur”, da cidade alemã de Potsdam.

A falta de espaço para moradia é um problema constante nas cidades alemãs, mas, nas áreas rurais, muitas propriedades são subutilizadas. Somente no estado da Turíngia, por exemplo, há cerca de 45 mil prédios vazios.

Um deles, o edifício Eiermann, fica em Apolda, uma pequena cidade no leste do país, que foi um importante centro de produção têxtil antes da reunificação alemã, em 1990.

Originalmente o prédio era casa de uma fábrica de tecelagem. No final da década de 1930, passou por uma ampliação e foi posteriormente usado para a produção de extintores de incêndio, até 1994.

No entanto, as enormes fachadas de vidro sem isolamento, a falta de um sistema de aquecimento moderno e de outras tecnologias dificultaram a reutilização de seus mais de 5 mil metros quadrados nos anos seguintes.

“Quão pouco é suficiente”

Desde 2016, a International Building Exhibition Thuringia (IBA Thuringia) assumiu o complexo industrial e o transformou em uma “fábrica aberta”, em que escritórios são distribuídos pelos andares sem divisões. O objetivo era evitar grandes reformas e construir apenas estruturas simples e desmontáveis.

O princípio orientador foi: “Quão pouco é suficiente” para utilizar o prédio? “O que não construímos de novo, mas continuamos a usar e reutilizar, não emite gases nocivos de efeito estufa”, explica a arquiteta Katja Fischer, diretora da IBA Thuringia.

Em um dos quatro andares do edifício, por exemplo, há um grande saguão sem paredes, e os escritórios são organizados em pequenas estufas de vidro. A luz entra nos corredores através das enormes janelas que já existiam no prédio.

No inverno, o sol aquece o ambiente e painéis luminosos no teto garantem uma temperatura mínima de pelo menos 15 graus no saguão.

O calor dos computadores e lâmpadas também aquece as estufas de vidro. Se isso não for suficiente, é possível fornecer aquecimento adicional com aquecedores infravermelhos, que são portáteis. Isso economiza energia porque a necessidade de aquecimento para as estufas de vidro é muito baixa. No verão, cortinas refletivas filtram o calor.

“Cada um pode decidir por si mesmo a temperatura que quer”, diz Elisa Dorn, IBA Thuringia. Ela trabalha em um dos escritórios de vidro há seis anos. “Não consigo imaginar um lugar mais agradável para trabalhar”, diz.

Outras salas foram construídas no saguão para receber reuniões. Elas funcionam como grandes cubos de madeira com paredes giratórias. O problema da falta de tecnologia do edifício foi resolvido com a disposição de um sistema de cabos centrais que passam sob o teto para fornecer energia.

Tudo foi projetado de forma circular. Os elementos embutidos, como os escritórios de vidro e as linhas de energia não são moldados em concreto. Ou seja, se for necessário, eles podem ser desmontados e reconstruídos em outro lugar.

Além disso, recursos que não agridem o clima foram privilegiados: em vez de cimento, foram usadas madeira, palha, argila e combinações simples e reversíveis desses materiais. Até as cortinas são feitas de material reciclado.

O problema da demanda

Em 2016, não estava claro como o edifício Eiermann poderia ser usado, especialmente porque não havia demanda imediata em Apolda.

O prédio recebeu um clube de pingue-pongue, além de exposições, eventos, uma estação de rádio, um laboratório de culinária e um laboratório de pesquisa. Até que finalmente chegou ao uso atual.

O Eiermann agora abriga uma pequena comunidade comercial, como um coworking. Alguns dos escritórios de vidro são ocupados por funcionários da Thuringia Building Culture Foundation e outros são ocupados outras empresas. Os salões recebem oficinas, estúdios, exposições e eventos. “Hoje, três quartos do espaço estão em uso”, diz Katja Fischer.

A pergunta que fica é por que tanto esforço está sendo feito em um único prédio de uma cidade pequena. “Há cidades na Turíngia que estão transbordando”, diz Elisa Dorn. No município vizinho de Jena, por exemplo, as vagas disponíveis para moradia estão cada vez mais escassas e, mesmo em Apolda, os preços estão subindo.

Por outro lado, em algumas regiões do leste da Alemanha, o número de habitantes está diminuindo. Isso significa que a infraestrutura local, como lojas de varejo, cafés e similares, está desaparecendo, o que torna os municípios pequenos menos atraentes. Uma esperança é que projetos como o edifício Eiermann ajudem a tornar as cidades menores mais atraentes novamente.

“Trata-se de um futuro digno de ser vivido por todos nós dentro dos limites do planeta, e os edifícios existentes desempenham um papel central nisso”, diz Fischer.