Com a falta de segurança fornecida pelas autoridades, casos de justiceiros caçando bandidos pelas ruas da cidade viram notícia. O Rio ainda não descobriu o remédio contra a violência.Chegou o verão, a melhor época do ano no Rio de Janeiro. Adoro passear de bicicleta pela orla, observando o que se passa nas praias cheias de pessoas. É uma mistura grande de turistas internacionais, nacionais e de cariocas, enchendo cada centímetro das areias.

Infelizmente, vê-se também os famosos arrastões de criminosos nas praias e o esquema de segurança das autoridades, com homens fortemente armados com metralhadoras patrulhando pela orla. O Rio de Janeiro continua lindo, e perigoso também.

Em novembro, houve a morte de um estudante que veio ao Rio para ver o show da cantora americana Taylor Swift. Numa madrugada, dormindo nas areias de Copacabana, ele foi morto com um golpe de faca. Outros vídeos mostram assaltos nas ruas do bairro famoso, em que bandidos espancam até aposentados.

Nas últimas semanas, o caso dos grupos de justiceiros, que caçam bandidos pela cidade, atraiu atenção na mídia nacional e internacional. Justiça com as próprias mãos é proibido, tanto que a Justiça está agora atrás dos membros desses grupos.

Assim, vemos, novamente, a velha discussão: a Justiça pega quem se defende do crime, ao invés de agir com mais rigor contra os verdadeiros bandidos, ouve-se as pessoas falarem aqui no Rio. O tal dos direitos humanos defendendo bandido, e não as vítimas.

Falta de credibilidade do estado

Compreendo a fúria de quem convive com os assaltos, roubos e a violência em geral. O espancamento de um empresário, no começo do mês em Copacabana, que tentou salvar uma mulher do ataque de bandidos, causou muita indignação na cidade.

Ainda mais porque alguns dos bandidos já tinham passagem pela polícia, como os envolvidos na morte do estudante fã de Taylor Swift. Tudo isso aumenta ainda mais a falta de credibilidade nas instituições do estado. Assim, não surpreende que os moradores busquem justiça com as próprias mãos.

Vamos lembrar que parte das milícias antigamente surgiram como grupos de autodefesa de moradores nos lugares onde o estado não estava presente. Hoje em dia, são criminosos e parte do problema. Um morador de um bairro controlado pelos milicianos me contou recentemente como esses grupos cobram taxas de todo mundo, no estilo de máfia italiana dos tempos antigos.

Lembro-me da esperança quando, em 2013, a polícia instalou as UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) nos morros da cidade. Agora vai, a mídia apostava. Mas era só para os turistas da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 verem. Depois disso, tudo desmoronou. E com isso a confiança de que a política seja capaz de solucionar o problema.

O Rio não tem solução, escuto muitas vezes. Foi um dos motivos de Jair Bolsonaro e sua turma que defende liberar o acesso dos “homens de bem” às armas ter tido tanto sucesso nas urnas aqui. Na falta de segurança fornecida pelo estado, é cada um por si.

O Rio continua sendo uma das cidades mais desiguais do país. E desigualdade social sempre gera conflitos, e, muitas vezes, violência. Já ouvi, nos meus 25 anos vivendo no Brasil, muitos planos sobre como acabar com a desigualdade e a violência.

Até esse momento chegar, procuro tomar muito cuidado. Tenho o privilégio que a maioria não tem: o de viver num dos bairros mais seguros da cidade. Mesmo assim, meu vizinho de aparentemente 80 anos de idade passeia com seu cachorro à noite segurando um revolver na mão. O Rio de Janeiro tem essas coisas.

Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.