04/05/2022 - 14:00
O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, fez uma forte defesa do direito ao aborto nesta quarta-feira (04/05), no dia seguinte à revelação de que a Suprema Corte dos Estados Unidos estaria prestes a anular a decisão histórica de 1973 que reconheceu o direito no país.
“As mulheres devem ter sempre o direito de escolha quando se trata de seus corpos e sua saúde”, afirmou o diretor em seu perfil no Twitter, sem mencionar diretamente o caso americano.
Tedros ressaltou que o acesso ao aborto pode salvar vidas e que restringi-lo não irá reduzir o número dessas intervenções. Pior ainda, pode levar mulheres e meninas a buscar procedimentos menos seguros.
A OMS divulgou em março suas novas diretrizes sobre o aborto, numa tentativa de proteger a saúde das mulheres, meninas e pessoas que possam engravidar, e evitar cirurgias arriscadas.
Segundo a entidade, cerca de 25 milhões de abortos inseguros são realizados anualmente em todo o mundo, o que resulta na morte de 39 mil pessoas. Milhões são hospitalizados devido a complicações pós-operatórias.
A maior parte das mortes ocorre em países de baixa renda, sendo 60% na África e 30% na Ásia.
Caso Roe vs. Wade
Os comentários do diretor-geral da OMS vieram após a enorme comoção gerada pelo vazamento de um rascunho assinado pelo juiz conservador Samuel Alito, da Suprema Corte americana, e que estaria circulando pelo tribunal de maioria conservadora desde fevereiro.
O fato de um projeto de parecer ter sido vazado para a imprensa enquanto o caso ainda está em andamento é algo extraordinário no âmbito da Suprema Corte, onde o sigilo de deliberações quase nunca foi violado.
O rascunho de 98 páginas chama o caso Roe vs. Wade – em que o mais alto tribunal do país considerou, em 1973, que o acesso ao aborto é um direito constitucional – de “totalmente sem mérito desde o princípio”.
“Acreditamos que Roe vs. Wade deve ser anulado”, afirma Alito no documento, intitulado “Parecer da Corte” e publicado no site do jornal Politico. “É hora de prestar atenção à Constituição e devolver a questão do aborto aos representantes eleitos do povo.”
No rascunho, o juiz alega ainda que o “aborto representa uma profunda questão moral” e que a “Constituição não proíbe os cidadãos de cada estado de regular ou proibir o aborto”. “A conclusão inevitável é que o direito ao aborto não está profundamente enraizado na história e nas tradições da nação”, declarou.
Se a conclusão for acatada pela Suprema Corte, os EUA voltarão à situação de antes de 1973, quando cada estado era livre para proibir ou autorizar a realização de abortos. Dada a grande divisão sobre a questão, espera-se que metade dos estados, especialmente no sul e no centro conservadores, proíbam rapidamente o procedimento.
Direitos sob ameaça
Os direitos reprodutivos têm estado sob ameaça nos EUA nos últimos meses, à medida que estados liderados por republicanos agem para aumentar as restrições, com alguns tentando proibir todos os abortos após seis semanas de gravidez.
A configuração da Suprema Corte americana foi profundamente alterada pelo ex-presidente Donald Trump, que durante seu mandato nomeou três juízes conservadores, solidificando a maioria conservadora do tribunal de nove membros. A Corte conta hoje com seis ministros conservadores e três liberais.
Desde setembro, o mais alto tribunal americano tem feito acenos a oponentes do aborto. Primeiro, recusou-se a impedir a entrada em vigor de uma lei do Texas que limitou o direito ao aborto às primeiras seis semanas de gravidez.
Durante uma revisão de dezembro de uma lei do Mississippi, que também questionou o prazo legal para o aborto, a maioria dos juízes do Supremo deixou claro que estava preparada para alterar ou mesmo derrubar, por completo, o princípio estabelecido pelo caso Roe vs. Wade.
Citando uma fonte próxima às deliberações da Suprema Corte, o Politico afirmou que outros quatro juízes conservadores – Clarence Thomas, Neil Gorsuch, Brett Kavanaugh e Amy Coney Barrett – deverão seguir o voto de Alito contrário ao aborto.
Por outro lado, os três juízes liberais do tribunal estariam trabalhando em uma dissidência, e não se sabe como o presidente da Suprema Corte, John Roberts, finalmente votaria.
O jornal Politico, que divulgou inicialmente o documento, enfatizou se tratar somente de um rascunho e que os juízes às vezes mudam seus votos antes de uma decisão final.
O vazamento provocou reações de indignação entre políticos democratas e organizações que defendem o direito ao aborto e os direitos das mulheres.
rc (AFP, Efe)