Após registrar a década mais quente da história, o planeta continuará em um nível sem precedentes de aquecimento global nos próximos cinco anos, segundo projeção da Organização Meteorológica Mundial (OMM), uma agência da ONU.

Os dados foram coletados pelo Serviço Meteorológico do Reino Unido com base nas previsões de dez centros internacionais e apontam que há 70% de chances de, até o final de 2029, o planeta voltar a superar a temperatura média de 1,5 ºC mais quente em relação aos níveis pré-industriais.

Em 2024, ano mais quente já registrado, aconteceu a primeira violação desse limite de aquecimento delimitado pelo Acordo de Paris de 2015. No pacto, os países se comprometeram a limitar o aquecimento global a 1,5 °C em relação ao período de 1850 a 1900, antes de a humanidade começar a queimar carvão, petróleo e gás de forma industrial. A combustão destes materiais emite CO2 – um gás de efeito estufa que impulsiona as mudanças climáticas.

No entanto, cada vez mais climatologistas consideram que o objetivo do acordo será impossível de alcançar, já que as emissões de dióxido de carbono não estão diminuindo globalmente. “Acabamos de viver os dez anos mais quentes já registrados. Infelizmente, este relatório não apresenta indícios de que isso vá mudar”, resumiu a secretária-geral adjunta da OMM, Ko Barrett.

Segundo a OMM, isso causaria condições climáticas extremas. “Cada fração de grau adicional de aquecimento pode intensificar ondas de calor, precipitações extremas, secas, derretimento das calotas polares, do gelo marinho e das geleiras”, disse a organização. Diversos estudos apontam que a superação do aquecimento de 1,5 ºC por um período mais prolongado pode ser irreversível.

“Isso é totalmente compatível com o fato de que estamos perto de ultrapassar os 1,5 °C de forma permanente até o final da década de 2020 ou início da década de 2030”, avaliou o climatologista Peter Thorne, da Universidade de Maynooth, na Irlanda. Qualquer aquecimento acima desse limite pode levar ecossistemas ao colapso.

Também são previstas condições mais úmidas no Sahel, norte da Europa, Alasca e norte da Sibéria, e uma nova temporada de secas na bacia amazônica.

Chance “não nula” de temperaturas acima de 2ºC

A OMM ainda calculou uma inédita probabilidade “não nula”, ou seja, de apenas 1%, de que pelo menos um dos próximos cinco anos ultrapasse os 2 °C de aquecimento. “É a primeira vez que vemos isso em nossas previsões”, observou Adam Scaife, do Serviço Meteorológico do Reino Unido. “É um choque.”

O especialista britânico lembrou que, há uma década, as previsões mostraram pela primeira vez a probabilidade – também “muito baixa” naquele momento – de que um ano ultrapassasse os 1,5 °C. Isso acabou acontecendo de fato em 2024.

Eventos climáticos extremos

Na semana passada, a China registrou temperaturas acima de 40 °C em algumas regiões, os Emirados Árabes Unidos chegaram a quase 52 °C e o Paquistão foi atingido por ventos mortais após uma intensa onda de calor.

“Já atingimos um nível perigoso de aquecimento global”, com recentes “enchentes mortais na Austrália, França, Argélia, Índia, China e Gana” e “incêndios florestais no Canadá”, apontou Friederike Otto, climatologista do Imperial College de Londres. “Continuar dependendo de petróleo, gás e carvão em 2025 é uma absoluta loucura”, acrescentou.

A OMM também prevê que o Ártico deverá aquecer em uma média 3,5 vezes maior que a global nos próximos cinco anos. A temperatura nesta região deve ficar 2,4 ºC acima do registrado durante os últimos 30 anos.

Com isso, a agência meteorológica prevê que a concentração de gelo marinho diminua nos mares do Norte Global – Barents, Bering e Okhotsk – enquanto o sul da Ásia deverá continuar recebendo mais chuvas do que o normal.

(afp, reuters)