Embora tenham pelos e produzam leite para alimentar seus filhotes, os ornitorrincos são tão diferentes de outros mamíferos que naturalistas britânicos chegaram a pensar que eles eram uma farsa. Um estudo recente, que analisou os monotremados – ordem de mamíferos que põem ovos, a qual inclui hoje o ornitorrinco e quatro espécies de outro animal bem esquisito, a equidna –, revelou que, durante o Cretáceo, havia mais diversidade deles, mesmo sendo esse o período por excelência dos dinossauros.

As reais dimensões dessa diversidade ainda são desconhecidas, sobretudo porque as regiões habitadas por esses antepassados não proporcionam facilidades para a preservação de fósseis ou estão sob o gelo hoje em dia. Mas um grupo de paleontólogos australianos conseguiu avanços importantes no estudo das origens dos monotremados, descritos em artigo publicado na revista Alcheringa: An Australasian Journal of Paleontology.

Imagem clara

Segundo o primeiro autor do artigo, dr. Timothy Flannery, da Universidade de Melbourne, ele decidiu, durante os estágios iniciais da pandemia de covid-19, que queria ajuda para responder à pergunta sobre a origem dos monotremados. Ele, o professor Kristofer Helgen, seu colega do Museu Australiano, e associados dos Museus Victoria, da Universidade Monash e da Universidade Swinburne, em Melbourne (Austrália), e no Smithsonian Institution (EUA), examinaram todos os fósseis monotremados significativos conhecidos para obter uma imagem clara de sua história. Chegaram então ao monotremado mais antigo conhecido, o Teinolophos trusleri – um pequeno animal parecido com um musaranho com áreas eletrossensíveis em seu focinho como os monotremados têm hoje.

No início do período Cretáceo, há 130 milhões de anos, o que se tornaria o sul da Austrália ficava perto do polo sul, suportando três meses de escuridão congelante todos os anos. Apesar disso, havia florestas, e nesses bosques o ancestral dos monotremados modernos conseguiu alimentar-se e sobreviveu.

Os pesquisadores também chegaram à origem das equidnas. Elas não aparecem no registro fóssil antes de 2 milhões de anos atrás. Segundo Helgen, os pesquisadores perceberam que as equidnas devem ter se desenvolvido isoladas em algum lugar antes de se espalharem pelo continente australiano. “Acreditamos que as equidnas se originaram em uma ilha no que agora se tornou parte da Nova Guiné e que chegaram à Austrália durante um período de troca de fauna por volta do início da Idade do Gelo”, disse ele.

Espaço não aproveitado

A extinção dos dinossauros não aviários criou um espaço para a disseminação dos mamíferos, não aproveitado pelos monotremados. Embora um fóssil monotremado Asfaltomylos patagonicus tenha sido encontrado na América do Sul há 63 milhões de anos, a ordem se restringiu à Austrália e ilhas às vezes conectadas como a Nova Guiné – e sempre foi superada em número, mesmo lá, por marsupiais.

O esforço de classificação de Flannery e outros coautores colocou todos os monotremados conhecidos, vivos e extintos, em cinco famílias, uma das quais, a Teinolophidae, não havia sido cientificamente descrita antes. Segundo os pesquisadores, as equidnas evoluíram do ornitorrinco na Nova Guiné durante um período em que a ilha ficou isolada da Austrália, antes de se espalhar para o sul quando os níveis de água eram baixos o suficiente para se juntar aos dois.

Flannery, que também trabalha no campo da ciência climática, disse esperar que, ao mostrar a origem dos monotremados, isso possa ajudar a proteger seu futuro. “O ornitorrinco está em declínio e a equidna gigante da Nova Guiné também está criticamente ameaçada. Então, eles estão sob pressão”, afirmou.