Até 2030, a Terra enfrentará um déficit de água de 40%, a menos que seja melhorada dramaticamente a gestão desse recurso. Essa é a conclusão do Relatório das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento de Água 2015 – Água para um Mundo Sustentável, lançado em Nova Délhi, na Índia, em celebração ao Dia Mundial da Água (22 de março). O documento é publicado pelo Programa Mundial de Avaliação dos Recursos Hídricos, liderado pela Unesco por meio da UN-Water (mecanismo interagencial da ONU para temas ligados à água e a questões de saneamento).

“Já existe um consenso internacional de que água e saneamento são essenciais para que muitos dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio sejam atingidos”, diz Michel Jarraud, presidente da UN-Water e secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial. “Eles estão indissoluvelmente ligados a questões como mudança climática, agricultura, segurança alimentar, saúde, energia, equidade, questão de gênero e educação. Agora, devemos olhar para a frente, com vistas à mensurabilidade, ao monitoramento e à implementação.”


A qualidade da água é muito precária em cidades como Daca (acima)

Essencial para o crescimento da economia e o combate à pobreza, a água é diretamente afetada pelo desenvolvimento econômico. A fim de solucionar esse desafio, devemos buscar um equilíbrio entre o suprimento e a demanda da água. Apesar do progresso obtido recentemente, 748 milhões de pessoas ainda não têm acesso a fontes de água potável protegidas de contaminação externa. Os mais afetados são as pessoas de baixa renda, os desfavorecidos e as mulheres. Ao mesmo tempo, para responder às necessidades de uma população em constante crescimento, os setores de agricultura e energia precisam produzir cada vez mais.

De agora até 2050, a agricultura, que consome a maior parte da água, precisará produzir mundialmente 60% a mais de comida (100% em países em desenvolvimento). Entre 2000 e 2050, a demanda da indústria por água deverá crescer até 400%. Enquanto a demanda por água deve aumentar cerca de 55% até 2050 e 20% das fontes mundiais de água subterrânea estão sendo superexploradas, porém, ainda não há um gerenciamento sustentável dos recursos. A irrigação intensa de plantações, a liberação descontrolada de pesticidas e produtos químicos em cursos d’água e a falta de tratamento de esgoto são provas dessa situação.

 

Recursos pressionados

Práticas como essas resultam em poluição em larga escala da água e desperdício significativo. Na Planície do Norte da China, a irrigação intensa causou uma queda de mais de 40 metros do lençol freático. O custo ambiental também tem sido notado em termos de danos às vezes irreversíveis a muitos ecossistemas no mundo, sobretudo em pântanos e áreas costeiras, prejudicando os serviços essenciais dos ecossistemas, como purificação e armazenamento de água. A mudança climática aumenta ainda mais essa pressão. A maior variação nas precipitações e a elevação das temperaturas causam mais evaporação e transpiração por parte das plantas.

Além disso, a subida do nível do mar ameaça os lençóis freáticos nas áreas costeiras. As reservas de água subterrânea de Calcutá (Índia), Xangai (China), Daca (Bangladesh) e outras cidades estão contaminadas pela água salgada. Portanto, destaca o relatório, está na hora de mudar o modo de avaliar, administrar e usar esse recurso. Em geral, as decisões sobre o uso da maior parte dos recursos hídricos são tomadas por um número limitado de atores (estatais, paraestatais e entes privados) e sua lógica é ditada mais por metas de curto prazo do que por preocupações ambientais.

O relatório enfatiza o papel das autoridades públicas para influenciar as escolhas que garantirão um futuro duradouro aos nossos recursos hídricos. Recomenda, principalmente, limitar o desenvolvimento de termelétricas, que hoje produzem 80% da eletricidade do mundo e consomem grandes quantidades de água. Essa limitação pode ser alcançada, por exemplo, pela garantia de subsídios para energias renováveis. A transição para modelos mais sustentáveis de produção tem um custo, mas, como o relatório aponta, tais investimentos são parte de um círculo virtuoso. Os estudos mostram que para cada dólar investido na proteção de uma área de captação, até US$ 200 podem ser poupados no tratamento de água.

A gestão das áreas de captação faz Nova York economizar cerca de US$ 300 milhões por ano. O relatório aponta que os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), a serem aprovados em 2030 pela ONU, deverão dedicar um objetivo unicamente aos recursos hídricos. O foco deve ser estendido da água potável e do saneamento (abordados nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio) para a gestão mundial de todo o ciclo da água. Os ODS serão finalizados no segundo semestre de 2015, durante a Assembleia Geral da ONU.