Confrontos com dezenas de mortos escalam tensão entre o governo paquistanês e o regime afegão. Conflito foi desencadeado após ataques de reduto do Talibã e ofensiva aérea contra Cabul.Dezenas de combatentes foram mortos em confrontos noturnos na fronteira entre Paquistão e Afeganistão, segundo ambos os lados informaram neste domingo (12/10), no episódio mais grave de violência entre os vizinhos desde que o Talibã assumiu o poder em Cabul.

O exército paquistanês informou que 23 de seus soldados foram mortos nos confrontos. O Talibã disse que nove de seus combatentes morreram.

Os dois lados alegam ter causado perdas muito maiores ao inimigo. O Paquistão afirmou ter matado mais de 200 combatentes do Talibã afegão , enquanto o Afeganistão disse ter matado 58 soldados paquistaneses.

Autoridades paquistanesas informaram neste domingo que o Paquistão fechou as passagens ao longo de sua fronteira de 2,6 mil km com o Afeganistão – uma linha traçada pelos britânicos em 1893 que é disputada até hoje.

Ataques do TTP disparam acusações

As tensões aumentaram após o Paquistão acusar o país vizinho de apoiar e proteger militantes do Tehreek-e-Taliban Pakistan (TTP), tomado como um reduto paquistanês do Talibã. Na sexta-feira, o grupo reivindicou uma série de ataques que mataram ao menos 20 agentes de segurança paquistaneses e três civis.

O regime afegão, que chegou ao poder em 2021, nega a presença de militantes paquistaneses em seu território e acusa o país vizinho de violar seu espaço aéreo. No dia anterior, ataques aéreos atingiram Cabul e um mercado no leste do Afeganistão, mas o Paquistão não reconheceu oficialmente a ofensiva.

Os ataques também coincidiram com uma visita rara à Índia do ministro das Relações Exteriores do Afeganistão, Amir Khan Muttaqi, que resultou no anúncio de um fortalecimento das relações.

A Índia é adversária histórica do Paquistão, e a visita causou preocupação em Islamabad.

Em retaliação, tropas afegãs abriram fogo contra postos de fronteira paquistaneses no sábado à noite. O Paquistão respondeu com tiros e artilharia, tanques, aviões de combate e drones.

Ambos os países alegaram ter destruído postos de fronteira do lado oposto. A maior parte dos confrontos cessou na manhã de domingo. Mas tiros esporádicos continuaram na região paquistanesa de Kurram.

Cabul afirmou que interrompeu os ataques, a pedido do Catar e da Arábia Saudita. Os dois países emitiram declarações expressando preocupação com os confrontos.

“Não há nenhum tipo de ameaça em qualquer parte do território afegão”, disse Zabihullah Mujahid, porta-voz do governo Talibã. “O Emirado Islâmico e o povo do Afeganistão defenderão sua terra e permanecerão firmes e comprometidos nessa defesa.”

O ministro do Interior do Paquistão, Mohsin Naqvi, também se manifestou. “O disparo das forças afegãs contra populações civis é uma violação flagrante das leis internacionais. […] Com uma resposta rápida e eficaz, as forças do Paquistão provaram que nenhuma provocação será tolerada”, disse.

Risco de escalada entre Paquistão e Talibã

O analista de segurança paquistanês Imtiaz Gul entende que o regime do Talibã está falhando em tomar “ações decisivas” contra o TTP. “Na última semana, houve pelo menos quatro ataques significativos, aparentemente orquestrados por indivíduos baseados no Afeganistão”, disse ele à DW. “A paciência do Paquistão está se esgotando, o que levou o governo a agir.”

O especialista em assuntos afegãos Omar Samad alertou que a hostilidade entre os dois lados “pode escalar para uma violência generalizada e ações militares além do que estamos vendo”, causando danos irreparáveis às relações entre Islamabad e Cabul.

“As tensões entre o establishment militar paquistanês e o governo afegão de fato vêm crescendo nos últimos dois anos, causadas em parte por erros e má gestão”, disse Samad à DW.

gq (Reuters, DW)