Após 18 anos de cerco, Forças de Apoio Rápido capturam El Fasher. Exército do país acusa as RSF de executarem na cidade mais de 2 mil civis em dois dias.As Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês) do Sudão, que há mais de dois anos lutam contra o Exército do país, foram acusadas de cometer atrocidades graves durante a captura de El Fasher, último reduto do Exército sudanês na região de Darfur, no oeste do país. A tomada da cidade ocorre após um cerco de 18 meses.

As Forças Conjuntas, grupo aliado ao Exército sudanês, afirmaram nesta terça-feira (28/10) que as RSF “cometeram crimes hediondos contra civis inocentes na cidade de El Fasher, onde mais de 2 mil cidadãos desarmados foram executados e mortos nos dias 26 e 27 de outubro, a maioria deles mulheres, crianças e idosos”.

O Exército sudanês confirmou que suas forças se retiraram de El Fasher, cidade que abriga diversos campos de refugiados e que se tornou central na disputa entre as RSF e as Forças Armadas Sudanesas.

A ONU afirma que “o risco de novas violações e atrocidades em grande escala por motivos étnicos em El Fasher aumenta a cada dia”, temor compartilhado por grupos locais e ONGs internacionais.

Segundo o Laboratório de Pesquisa Humanitária da Universidade de Yale, com base em análises de código aberto e imagens de satélite, a cidade “parece estar em um processo sistemático e intencional de limpeza étnica das comunidades nativas não árabes fur, zagaua e berti por meio de deslocamento forçado e execução sumária”.

Isso incluiu o que parecia ser “operações de limpeza porta a porta” na cidade, diz o monitor em um relatório publicado na segunda-feira. Segundo o documento, as ações “podem ser consistentes com crimes de guerra e crimes contra a humanidade e podem chegar ao nível de genocídio”.

Os paramilitares das RSF acumulam um histórico de atrocidades, tendo matado cerca de 15 mil civis de grupos não árabes na capital de Darfur Ocidental, El Geneina.

O Exército, que luta contra a RSF desde abril de 2023, também vem sendo acusado de crimes de guerra.

Ganhos da RSF podem consolidar divisão

Na terça-feira, o presidente da Comissão da União Africana, Mahmoud Ali Youssouf, expressou no X sua “profunda preocupação com a escalada da violência e as atrocidades relatadas em El Fasher”.

Youssouf condenou “os alegados crimes de guerra e assassinatos de civis por motivos étnicos”. Nela, apelou à “cessação imediata das hostilidades e à abertura de corredores humanitários para permitir que a ajuda humanitária chegue às populações afetadas”.

A RSF estabeleceu a região de Darfur como seu reduto, de onde operam seus principais líderes, como o general Mohamed Hamdan Dagalo.

Observadores dizem que a captura de El Fasher, capital de Darfur do Norte, pode marcar um ponto de inflexão no conflito em curso no Sudão, que já matou dezenas de milhares de pessoas e deslocou quase 12 milhões. Com os ganhos, as RSF passaram a controlar todas as capitais estaduais da região de Darfur, divindo o país em um eixo leste-oeste.

O cerco a El Fasher levou à cidade uma das piores crises humanitárias do mundo, segundo a ONU, onde 260 mil civis permanecem confinados. Campos de refugiados localizados nos arredores da cidade foram oficialmente declarados como em situação de fome, enquanto dentro dela há relatos de pessoas que passaram a se alimentar de ração animal.

A Comissão Europeia e a ONU pediram nesta terça-feira a entrada imediata de ajuda humanitária em Darfur para aliviar a situação de centenas de milhares de civis afetados pela crescente violência e atrocidades relatadas em Al Fasher.

gq/md (AFP, Reuters, DW)