Uma projeção 3D elaborada pelo designer brasileiro Cícero Moraes e publicada no periódico “Archaeometry” indicou que o Santo Sudário não poderia ter envolvido o corpo de Jesus Cristo após a crucificação. O tecido, que está preservado em uma igreja de Turim, na Itália, possui a imagem de um homem com cabelos longos e barba atribuído ao messias da fé cristã.

Apesar da Igreja Católica nunca ter adotado uma posição oficial sobre o Sudário, o artefato passou a ser venerado por cristãos como um lençol que teria coberto o corpo de Jesus após ele ser morto pelos romanos na crucificação. O tecido foi documentado pela primeira vez em 1354, na França.

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Cícero Moraes, que já fez estudos com reconstruções faciais de personalidades históricas, apontou à IstoÉ que é impossível a imagem do homem no tecido ter sido feita por um contato direto com o corpo de Jesus. O designer conta que a anatomia do homem do Sudário era muito rígida. “Um ser humano é mais ondulado, mais gracioso. Tem uma harmonia maior na anatomia”, comenta.

Apesar disso, Moraes explica que este não é o maior problema com o Santo Sudário. O designer pontua que um corpo humano perde suas proporções quando marcado em um pano ou um papel. Algo similar acontece com a representação do mapa-múndi, em que determinadas regiões do planeta são distorcidas quando colocadas em uma visualização plana.

“Se você pegar um ser humano que sangrou, que foi pigmentado por alguma tinta, colocar um tecido sobre ele e depois abrir esse tecido, o padrão que vai ficar é como de um corpo deformado.”, indica Moraes, acrescentando que sua hipótese é de que, na realidade, o homem do Sudário seria uma imagem feita em baixo-relevo. “Para ficar aquele padrão, teria que ser uma estrutura mais fina.”

Para determinar que a imagem do Sudário deveria estar distorcida, Moraes utilizou um software 3D para simular um tecido, um corpo humano e uma figura de baixo-relevo. Posteriormente, foi analisada a textura gerada pelas marcas do corpo e do baixo-relevo no tecido esticado.

O estudo não trata sobre como esse padrão de baixo-relevo poderia ter sido feito no Sudário, mas há a possibilidade de que a imagem foi elaborada com uma pigmentação superficial.

Sobreposição da textura deixada pela simulação em 3D de um corpo humano no tecido do Sudário (à esquerda), o Santo Sudário (centro) e a textura gerada pela simulação em 3D entre o tecido do Sudário e um baixo-relevo (à direita) (Crédito: Cícero Moraes)

Em nota divulgada na terça-feira, 5, pelo Vaticano, o arcebispo de Turim, Roberto Repole, disse estar preocupado “com a superficialidade de certas conclusões” e apontou falta de originalidade na abordagem. Segundo Repole, “numerosos estudos físico-químicos” já teriam descartado “a origem pictórica ou por contato com um baixo-relevo”.

O professor Andrea Nicolotti, da Universidade de Turim, escreveu na revista “Skeptic” que Moraes criou uma projeção “belíssimas” com a ajuda de um software, mas não trouxe informações inéditas. “Há pelo menos quatro séculos sabemos que a imagem corporal do Sudário é comparável a uma projeção ortogonal sobre um plano, o que certamente não poderia ter sido criado por contato com um corpo tridimensional”, afirmou.

Polêmicas do Santo Sudário

Embora o estudo não entre no polêmico terreno da datação do Sudário, ele atravessa uma discussão há séculos insolucionada.

Em 1989, um teste de radiocarbono situou o tecido entre os anos 1260 e 1390 d.C., o que coincide com sua primeira aparição documentada na França, em 1354.

Mas em 2022, uma análise mais recente e controversa baseada em raios X sugeriu que o linho poderia ser do século 1º d.C., o que recolocaria o manto na época de Jesus. O estudo foi liderado pelo cientista italiano Liberato De Caro, do Instituto de Cristalografia em Bari, e publicado na revista Heritage.

A pesquisa, que emprega técnicas avançadas de dispersão de raios X, sugere que o envelhecimento da celulose nas fibras do linho pode ter sido afetado pelas baixas temperaturas nas quais foi conservado por séculos. Isso explicaria por que a maior parte do desgaste do tecido teria ocorrido antes do século 14, tornando a datação por radiocarbono menos precisa do que se imaginava.

No entanto, os próprios pesquisadores alertam que suas conclusões exigem comprovar que o lençol foi mantido em condições muito específicas de temperatura e umidade durante 13 séculos antes de sua aparição documentada. Nenhuma dessas provas foi definitiva, e o debate continua em aberto.

*Com informações da Deutsche Welle

**Estagiário sob supervisão