14/04/2025 - 16:35
Tarifaço de Trump gera incertezas sobre economia global. Aumento da oferta da Opep+ amplifica choque e leva commodity ao menor nível em 4 anos – com consequências para países produtores.A sequência de anúncios sobre tarifas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, jogou os mercados financeiros em uma montanha-russa nos últimos dias, mas uma commodity em particular emergiu como uma das principais vítimas: o petróleo.
O preço do contrato Brent, usado como referência inclusive pela Petrobras, já vinha em queda desde a volta de Trump à Casa Branca, em janeiro. No entanto, após o republicano anunciar generalizadas tarifas recíprocas na semana passada, o ativo despencou ao menor nível em quatro anos.
O barril do Brent agora tem operado perto da faixa dos US$ 60, nos patamares mais baixos desde o choque causado pela pandemia de covid-19, no começo de 2020.
A guerra tarifária entre EUA e China pressiona as expectativas de crescimento econômico global, enquanto a incerteza geral sobre o comércio pesa fortemente no preço do petróleo.
Mais do que as tarifas por si só, investidores temem o quadro contínuo de dúvidas sobre a retaliação dos países envolvidos, avalia Carole Nakhle, CEO da consultoria de energia Crystol Energy.
“Acrescente-se o fato de que isso acontece enquanto a demanda por petróleo já não estava crescendo enquanto a oferta é abundante e o resultado são os níveis de preços que estamos observando agora”, explica.
Choque da Opep+
Para agravar o cenário, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+) provocou mais um grande choque nos mercados no dia seguinte ao anúncio de Trump. O grupo formado por 12 membros do cartel mais outros 10 grandes exportadores informou que aumentaria a oferta da commodity significativamente a partir de maio.
Sob a liderança de Arábia Saudita e Rússia, a Opep+ vinha limitando a produção petrolífera na última década para manter os preços elevados. A expectativa era pela manutenção dessa postura.
Mas analistas acreditam que a mudança repentina é uma tentativa de controlar países como Cazaquistão e Iraque, que desrespeitaram o acordo aos produzir mais do que o combinado.
Essas nações “esgotaram a paciência dos membros mais disciplinados”, que estavam “carregando o fardo dos cortes” na oferta há algum tempo, afirma Nakhle.
O Cazaquistão, por exemplo, irritou a Arábia Saudita ao ampliar a produção no campo de petróleo de Tengiz, no noroeste do país. Já o Iraque reduziu a oferta recentemente, mas não prometeu compensar o descumprimento de suas cotas nos últimos anos.
Para Nakhle, a aliança está preparada para um ambiente de longo prazo de preços mais baixos. “A Opep+ acredita que seria melhor para alguns membros, especialmente aqueles que investiram pesadamente na expansão de sua capacidade de produção, protegerem sua participação de mercado”, ressalta.
Nakhle acrescenta que a organização pode estar se posicionando para uma redução da oferta de membros como Rússia, Venezuela e Irã por conta de fatores geopolíticos, como sanções e uma possível operação militar contra os iranianos. “Então, o mercado pode absorver os barris adicionais sem sucumbir os preços”, diz.
Preocupação no Kremlin
Trump tem promovido a queda nas cotações do petróleo como um reflexo do sucesso de suas políticas, essencial para o alívio no valor da gasolina nas bombas. “Temos tudo [os preços] em níveis que ninguém nunca achou ser possível”, escreveu na rede social Truth Social.
Vários analistas, porém, veem o movimento como um sinal de preocupação sobre o estado da economia mundial. O banco de investimentos americano Goldman Sachs prevê que o Brent pode cair abaixo de US$ 40 por barril até o final de 2026 em um “cenário extremo”.
Para a Rússia, em particular, o quadro teria profundas consequências políticas e econômicas. O país conseguiu resistir a sanções do Ocidente desde o começo da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022, em parte, por conta da escalada dos preços do petróleo, que impulsiona as receitas domésticas.
Na visão de especialistas, a reversão dessa tendência teria impacto considerável nos planos orçamentários e de gastos do Kremlin, o que poderia levá-lo a repensar a campanha militar em andamento.
As despesas com defesa mais que triplicaram desde 2021 e devem atingir um recorde de 13,5 trilhões de rublos (R$ 960 bilhões) no orçamento de 2025, com um aumento de 25%.
De acordo com dados compilados pela agência de notícias Reuters, o preço do petróleo dos Urais, referência para a Rússia, caiu a US$ 53 no final da semana passada.
Chris Weafer, consultor de investimentos que vive e trabalha na Rússia há mais de 25 anos, disse à DW que a eventual persistência dessa queda forçará o Banco Central russo a “enfraquecer significativamente o rublo” e possivelmente também obrigará o governo a reduzir seus planos de gastos.
Weafer reconhece que petróleo não representa mais a mesma parcela das receitas russas que antes, caindo de cerca de 50% há uma década para cerca de 30% hoje. Mesmo assim, uma baixa sustentada nos preços teria um grande impacto em todos os aspectos da política do Kremlin, afirma.
O governo russo não teria “dinheiro sobrando” se essas receitas desabassem mais. “A posição financeira da Rússia parecerá muito menos segura, talvez dentro de um ano, e isso claramente poderia minar a capacidade da Rússia de negociar um acordo em relação à Ucrânia”, acrescentou.