Entre os muitos efeitos do uso da cannabis, um dos mais conhecidos é a fome incontrolável, também conhecida entre os adeptos da planta como ‘larica’. 

Por muitas décadas, usuários e especialistas se questionaram se a capacidade de devorar dois pacotes de biscoito em 10 minutos era apenas uma consequência psicológica do uso, seja por desorientação, ou até mesmo ansiedade.

Em 1975, um estudo publicado pelo Behavioral Biology concluiu que ‘nenhuma explicação cientifica, tanto em humanos quanto animais, é aceitável’ e que a pesquisa deixou ‘mais perguntas do que respostas’

Porém, com a onda de descriminalização e legalização ao redor do mundo a partir dos anos 2000, a ciência conseguiu expandir seu foco de estudos sobre a planta e desvendar as primeiras pistas por trás do apetite insaciável dos usuários. 

‘É como pisar no freio e o carro acelerar’

Em 2015, um grupo de pesquisadores da Universidade Yale, nos EUA, descobriu que a cannabis é capaz de agir diretamente em neurônios responsáveis pelo controle do apetite e ‘bagunçar’ os sinais que eles recebem do nosso cérebro.

“A maconha engana o nosso sistema nervoso central. Os neurônios que pensávamos ser responsáveis por ‘desligar’ nossa sensação de fome são ativados. É como pisar no freio de um carro e ele acelerar”, explica Tamas Horvath, neurologista da Yale que participou do estudo.

A ciência já tinha conhecimento de que nosso corpo é capaz de produzir canabinoides, lipídios que controlam nosso humor, apetite e memória. 

O THC (tetraidrocanabinol), substancia produzida pela maconha, é capaz se agarrar aos canabinoides naturais do nosso corpo e copiar suas propriedades. Esses novos sinais são recebidos pelo hipotálamo do nosso cérebro, provocando os tão conhecidos efeitos físicos e psicológicos da cannabis, entre eles, o apetite voraz.

“Mesmo quando o usuário acabou de fazer uma refeição completa, os neurônios transitem sinais de que você está faminto. Basicamente, a saciedade se transforma em fome”, explica Horvath

Propriedade é mais útil do que parece

Brincadeiras e apelidos a parte, a ciência enxerga a ‘larica’ com bons olhos devido as suas possíveis aplicações médicas. Por exemplo, pacientes que passam por sessões de quimioterapia podem se beneficiar com o estímulo do apetite

Resta saber se um dia essas propriedades poderão ser sintetizadas em laboratório para uma ação direta, localizada e livre dos outros efeitos causados pela maconha.