16/07/2025 - 16:48
Projeto anti-imigração votado no Parlamento dificulta aquisição de cidadania e residência, restringe regras para reunião familiar e cria polícia de fronteira. Brasileiros serão afetados.O parlamento de Portugal aprovou nesta quarta-feira (16/07) um projeto de lei anti-imigração que modifica a Lei de Estrangeiros e, entre outras medidas, limita a reunião familiar de imigrantes.
Uma segunda proposta, que endurece também a Lei de Nacionalidade e torna mais difícil a obtenção da cidadania portuguesa, deve ser votada em setembro (leia mais abaixo).
O pacote une uma proposta do governo do primeiro-ministro conservador Luís Montenegro a outra do partido ultradireitista Chega e deve afetar diretamente brasileiros beneficiados por programas anteriores que flexibilizavam a estadia prolongada no país.
Isso porque a reforma já aprovada modifica os requisitos de residência para os nacionais de países de língua portuguesa e as regras para solicitar um visto de trabalho.
O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, tem 20 dias para sancionar ou vetar o texto, aprovado com votos de sua coalizão governista e da ultradireita. Todas as siglas de esquerda rejeitaram o projeto e o partido Iniciativa Liberal (IL) se absteve.
A oposição critica a rapidez com que a proposta foi aprovada. Ela faz parte de um esforço anti-imigração mais amplo do governo, que em 2024 já havia aprovado um conjunto de leis semelhantes.
Turistas brasileiros não poderão mais se regularizar
A principal mudança é o fim definitivo da possibilidade de entrar no país legalmente de forma temporária, como turista, para só depois pleitear uma autorização de residência.
Essa alternativa já havia sido restringida em 2024, com o fim da manifestação de interesse, mas ainda contava com salvaguardas em casos específicos para cidadãos do Brasil e de Timor-Leste.
O modelo permitia uma permanência estendida no país, já que o solicitante poderia ficar em Portugal legalmente enquanto aguardava a análise de seu caso.
Reunião familiar limitada
Se o projeto for sancionado, imigrantes que já estão no país só poderão solicitar um visto para seus familiares após dois anos de residência legal. Hoje não existe tempo mínimo.
Essa regra só será relaxada se o familiar for menor de idade, já estiver em Portugal vivendo debaixo do mesmo teto em relação de dependência com o imigrante e tiver entrado legalmente no país.
Além disso, a proposta também exige que o solicitante da reunião familiar viva em um local que cumpra “normas gerais de segurança e salubridade” e que os familiares aprendam a língua portuguesa e os “princípios e valores constitucionais” para obter a autorização.
Vistos para lusófonos
O texto também endurece o regime de vistos para falantes de língua portuguesa, ao determinar que a solicitação precisa ser feita previamente, no país de origem.
Vistos para procura de trabalho também só serão disponibilizados a imigrantes “altamente qualificados”.
As profissões que se enquadram nessa categoria ainda não foram detalhadas. Demais profissionais poderão obter visto de trabalho apenas se já tiverem contrato antes de entrar no país.
Nova unidade de controle de fronteiras
Junto a essa proposta, o Parlamento criou uma unidade especial de fronteiras dentro da Polícia de Segurança Pública (PSP).
Entre as responsabilidades da nova unidade estarão controlar as fronteiras aeroportuárias e atribuir vistos nessas instalações, controlar a permanência de cidadãos estrangeiros em Portugal, gerenciar os processos de expulsão coercitiva, readmissão e retorno voluntário de estrangeiros.
Também serão responsáveis por administrar os centros de acolhimento temporário de imigrantes nas fronteiras.
Projeto anti-imigração ampliado
O movimento faz parte de uma ofensiva anti-imigração em Portugal, que ecoa outros países europeus na tentativa de endurecer a naturalização de estrangeiros.
A imigração se tornou um dos principais temas políticos no país e alavancou o partido de ultra direita Chega, segundo mais votado na recente eleição legislativa.
Em junho, o país já havia começado a notificar milhares de estrangeiros que tiveram suas manifestações de interesse negadas, incluindo brasileiros que não se enquadravam nos critérios para o benefício.
Mudanças na lei de cidadania portuguesa
Para setembro, está pendente de votação em plenário a proposta de alteração da Lei da Nacionalidade, também apresentada pelo governo de Montenegro.
O projeto prevê o fim do direito automático à cidadania por nascimento para filhos de imigrantes. Hoje, a nacionalidade portuguesa é concedida automaticamente a essas crianças, mas, com a mudança, só poderá ser solicitada se o estrangeiro comprovar pelo menos 3 anos de residência legal antes do nascimento do filho.
Outra mudança relevante é o aumento do período de residência mínima exigido para solicitar a nacionalidade portuguesa, que passará de 5 para 10 anos. Para cidadãos de países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), como os brasileiros, esse prazo será reduzido para 7 anos.
Além disso, o projeto prevê que imigrantes naturalizados poderão perder a cidadania caso sejam condenados por crimes graves.
Oposição critica rapidez da aprovação
Segundo o governo, há cerca de 1,5 milhão de imigrantes vivendo em Portugal, equivalente a 15% da população. Esse número é quatro vezes maior do que o de 2017. Os brasileiros formam a maior comunidade de estrangeiros no país – eram mais de 500 mil em 2023, segundo um relatório do Itamaraty, e a segunda maior no exterior, perdendo apenas para os Estados Unidos.
O deputado oposicionista Pedro Delgado Alves, do Partido Socialista, criticou os “atropelos procedimentais” e a “hiper-rapidez” que o governo imprimiu para aprovar o projeto. Segundo ele, os conteúdos são problemáticos e impedem imigrantes de acessarem seus direitos.
Já o governista António Rodrigues, do Partido Social Democrata, recusou a ideia de que o seu partido não quer debater o tema e lamentou que a oposição não tenha trazido propostas de alterações.
“A matéria da imigração foi a mais discutida nos últimos 15 meses em Portugal. [Os deputados socialistas] tiveram a oportunidade de propor, de refletir. A urgência exige-se por anos de incapacidade de legislar, por incapacidade de decidir”, defendeu.
gq (EFE, LUSA, OTS)