21/11/2025 - 16:59
Jornalista croata acusa Aleksandar Vucic de ter atuado nos anos 1990 como tradutor para supostos grupos de estrangeiros que viajaram a Sarajevo com o objetivo de atirar em civis. Líder sérvio rejeita acusação.O presidente da Sérvia, Aleksandar Vucic, teve seu nome citado no escândalo relacionado a um suposto “safári humano” ocorrido durante a Guerra da Bósnia. Procuradores da Itália abriram na semana passada uma investigação para apurar a existência de um “turismo de snipers” em que cidadãos italianos teriam gasto grandes quantias a militares sérvios para atirarem contra cidadãos bósnios durante o cerco de Sarajevo, ocorrido entre 1992 e 1996.
A nova acusação partiu do jornalista croata Domagoj Margetic, que apresentou uma denúncia à procuradoria de Milão contra o atual presidente sérvio. Margetic alega que Vucic teria atuado como voluntário ao lado de forças sérvias baseadas no antigo cemitério judeu da capital bósnia, como parte do Novo Destacamento Chetnik de Sarajevo, liderado pelo comandante Slavko Aleksic.
Destes locais, atiradores de longa distância alvejavam de forma aleatória civis sitiados, levando à morte de mais de 10 mil pessoas. Em 2016, o ex-líder sérvio Radovan Karadzic foi condenado por crimes de genocídio pelo Tribunal Penal Internacional pelos massacres ocorridos no conflito.
Em uma carta aos procuradores, Margetic afirma ter reunido depoimentos de autoridades bósnias e um vídeo de 1993 que supostamente mostraria Vucic ao lado de homens armados portando um rifle de precisão. À época, Vucic tinha 23 anos.
O jornalista alega que o atual presidente da Sérvia esteve estacionado em uma das linhas de frente do cerco a Sarajevo e teria “facilitado” a circulação de cidadãos endinheirados que se uniam à milícia sérvia “por diversão”, atuando como tradutor.
O inquérito que investiga o caso foi aberto pela procuradoria de Milão após um jornalista italiano juntar uma série de testemunhos que apontariam para a existência do suposto “safári humano”. Contudo, as alegações de Margetic ainda não foram acatadas no processo ou aceitas como evidências.
Vucic nega envolvimento
À imprensa, Vucic chamou as acusações de “mentiras”, que buscam tratá-lo como um “monstro”. “Eu nunca matei ninguém, nunca feri ninguém e nunca fiz algo deste tipo. Mentem sobre mim como sniper em Sarajevo há 10 ou 20 anos, e continuam a mentir”, disse ele.
Há anos Vucic nega sua participação nos crimes cometidos em Sarajevo. Em 2021, afirmou que alegações sobre sua presença na linha de frente do conflito são “politicamente manipuladas”.
Segundo o jornal britânico The Times, a porta-voz do governo, Suzana Vasiljevic, também chamou o caso de “desinformação maliciosa”. “Essa narrativa carece de fundamento factual e foi elaborada com o objetivo operacional de causar danos à reputação [de Vucic]”, disse ela.
Vasiljevic também argumentou que à época do cerco, o atual presidente trabalhava como jornalista e tradutor, sem qualquer contato com estruturas militares, armas de combate ou operações de guerra.
A porta-voz do governo sérvio também rebatou as acusações do jornalista croata, afirmando que o suposto rifle visto nas imagens seria, na verdade, um tripé usado por Vucic em seu trabalho como jornalista.
Já o jornalista croata Domagoj Margetic, porém, alega que em uma entrevista de 1994, Vucic teria afirmado que foi voluntário no cemitério judeu em Sarajevo, quando a milícia sérvia liderada por Slavko Aleksic controlava o local.
Segundo Margetic, o militar alegou em 2017 que Vucic realizava traduções para estrangeiros que chegavam no posto durante os combates.
Sérvio sobre pressão doméstica
No momento, o presidente sérvio enfrenta o movimento de protesto mais duradouro da história recente da Sérvia, acusado de negligência e acobertamento no desastre que envolveu o desabamento de uma marquise numa estação de trem que deixou 13 vítimas.
No poder desde 2012, Vucic tem estreitado laços com Rússia e China e restringindo liberdades democráticas para consolidar seu controle político.
Ele foi ministro da Informação do ditador Slobodan Milosevic, em 1995. Em 20 de julho daquele ano, com o genocídio bósnio ainda em andamento, ele declarou no parlamento em Belgrado que, “para cada sérvio morto, cem muçulmanos [bósnios] seriam mortos”. Ele nunca se desculpou pela declaração, e hoje espalha a narrativa de que “todos os lados sofreram” nas guerras iugoslavas, mas só os sérvios não são reconhecidos como vítimas.
gq (OTS)