15/07/2022 - 11:20
O dinheiro não compra a felicidade. Muitos de nós ouvimos isso em algum momento de nossas vidas, mas isso não parece impedir muitas pessoas de quererem mais – mesmo pessoas muito ricas. A questão é: quanto dinheiro cada um de nós precisa para satisfazer seus desejos?
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Os economistas geralmente tratam as pessoas como tendo desejos econômicos ilimitados, mas recursos limitados para satisfazê-los – um conceito econômico fundamental conhecido como escassez. Essa ideia é frequentemente apresentada como um fato básico sobre a natureza humana. Nossa pesquisa publicada recentemente descobriu que apenas uma minoria de pessoas realmente tem desejos ilimitados, e que a maioria ficaria feliz com uma quantia limitada, embora ainda significativa, de dinheiro.
Desejos atendidos
Pesquisamos pessoas sobre esse assunto em 33 países em todos os continentes habitados, obtendo respostas de cerca de 8 mil pessoas no total. Incentivamos os participantes a se concentrarem no que significaria ter todos os seus desejos atendidos, pedindo-lhes que imaginassem sua “vida absolutamente ideal”, sem se preocupar se era realmente realizável.
Para avaliar as necessidades econômicas, pedimos às pessoas que considerassem quanto dinheiro elas queriam nessa vida ideal. Mas o dinheiro raramente vem de graça, e pensamos que suas respostas poderiam ser influenciadas pelo que eles imaginam que seria necessário para obter grandes quantias de dinheiro – trabalhando longas horas, investimentos de alto risco ou até mesmo criminalidade.
Então fizemos isso por acaso, pedindo que eles escolhessem um prêmio em uma loteria hipotética. Eles foram informados de que as chances de ganhar cada loteria eram as mesmas, então sua escolha era sobre quanto dinheiro eles queriam em suas vidas ideais, não em qual loteria eles tinham mais probabilidade de ganhar.
Os prêmios da loteria começavam em US$ 10 mil (convertidos para moedas locais), com opções aumentando em um múltiplo de 10. Na época em que realizamos o estudo, o prêmio principal de US$ 100 bilhões tornaria essas pessoas as mais ricas no mundo.
Quem quer ser um bilionário?
Nossa previsão era direta: se as pessoas realmente têm desejos ilimitados, devem sempre escolher o máximo de US$ 100 bilhões. Mas em todos os 33 países, apenas uma minoria escolheu o prêmio principal (8% a 39% em cada país). Na maioria dos países, incluindo o Reino Unido, a maioria das pessoas escolheu uma loteria equivalente a US$ 10 milhões ou menos, e em alguns países (Índia, Rússia) a maioria escolheu US$ 1 milhão ou menos.
Também queríamos entender as diferenças entre pessoas com desejos limitados e ilimitados. Nossas análises descartaram muitos fatores pessoais – as respostas não variaram significativamente por gênero, educação ou status socioeconômico. No entanto, os mais jovens relataram desejos ilimitados do que os mais velhos, embora isso varie entre os países. Nos países menos desenvolvidos economicamente, a influência da idade foi mais fraca.
Também examinamos as diferenças culturais usando um modelo amplamente utilizado das principais dimensões da diferença cultural. Descobrimos que mais pessoas escolheram a loteria de US$ 100 bilhões em países onde havia maior aceitação da desigualdade na sociedade (a chamada “distância do poder”) e onde havia mais foco na vida em grupo (o chamado “coletivismo”).
Por exemplo, a Indonésia tem alta distância do poder e coletivismo e quase 40% da amostra indonésia escolheu US$ 100 bilhões. O Reino Unido é relativamente baixo em coletivismo e distância do poder, e menos de 20% escolheram o prêmio máximo da loteria.
Por fim, perguntamos às pessoas sobre a mudança mais importante que fariam se ganhassem o prêmio, bem como classificar diferentes valores que eram importantes para elas, como ter poder ou ajudar os outros. Aqui houve alguma inconsistência. Pessoas com desejos ilimitados eram mais propensas a nos dizer que usariam o dinheiro para ajudar os outros, mas em termos de valores eles não estavam mais preocupados em ajudar os outros do que aqueles com desejos limitados.
As consequências de desejos (i)limitados
Assumir que as pessoas têm desejos econômicos ilimitados fornece uma justificativa para políticas que priorizam o crescimento econômico, como políticas de taxas de juros, para permitir que as pessoas alcancem tantos desejos quanto possível. Mas a busca incessante por riqueza e crescimento tem consequências cada vez mais prejudiciais para o nosso mundo.
Mostrar que desejos ilimitados não são um desejo universal humano, e que o nível de desejos das pessoas varia de acordo com os valores e a cultura, sugere que eles estão abertos à influência social. Os anunciantes já sabem disso, gastando enormes quantias para tentar nos convencer a querer coisas que antes não conhecíamos e com a qual nem nos importávamos. Até mesmo alguns economistas questionaram se os desejos produzidos pelo marketing deveriam realmente ser chamados de desejos.
Os resultados desta pesquisa nos dão esperança de que a natureza humana não esteja fundamentalmente em desacordo com a vida sustentável. Muitos estão prestando mais atenção em como melhorar e até reorientar a sociedade para viver uma vida plena sem esgotar os recursos do nosso planeta. Compreender a vida e as motivações de pessoas com necessidades econômicas limitadas pode nos ensinar algo sobre como conseguir isso.
* Paul Bain é professor associado de psicologia na Universidade de Bath (Reino Unido).
** Este artigo foi republicado do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original aqui.