Rir é um dos mais prazerosos comportamentos humanos, mas, até a Idade Média, havia sérias dúvidas a respeito de suas eventuais qualidades positivas. Embora o filósofo grego Aristóteles reconhecesse que o riso é saudável – desde que originário de uma situação que não envergonhe outra pessoa –, seu antecessor Platão considerava que ele distanciava o ser humano da verdadeira sabedoria. A Igreja cristã medieval renegava o riso, alegando, tão somente, que Jesus não teria rido em sua vida terrena – pelo menos segundo os evangelhos.

O tempo, contudo, foi diluindo essas resistências, e nas últimas décadas o riso começou a ganhar importância em termos de saúde. Hoje em dia ele é considerado benéfico em mais de 20 condições diferentes. Entre essas, é conhecida a história do professor e jornalista norte-americano Norman Cousins, que superou graves complicações cardíacas seguindo à risca um programa no qual um dos itens fundamentais era assistir a comédias dos Irmãos Marx.

Havia, porém, uma dúvida científica complexa: como separar o ato de rir de uma sensação geral de bemestar na qual o riso estaria envolvido? O cientista inglês Robin Dunbar conseguiu esse feito recentemente e comprovou que o ato físico de rir faz mesmo muito bem à saúde (veja tabela na prôxima página).

O riso – a resposta psicofisiológica ao humor ou a outros estímulos – exige bastante do corpo. Ele abrange contrações do diafragma, sons vocais repetitivos produzidos pelas câmaras de ressonância da faringe, boca e cavidades nasais, o movimento de aproximadamente 50 músculos (sobretudo ao redor da boca) e, em certos casos, até lágrimas.

“O riso é, na verdade, uma coisa muito estranha, e é por isso que me interessei por ele”, diz Dunbar. Psicólogo evolucionário da Universidade de Oxford, ele se interessa sobretudo pelo riso social – não a gargalhada sinistra de um vilão de ficção ou o “riso polido” induzido por uma situação em que outros riem sem saber por que, mas aquela risada descontraída e contagiante como as deflagradas por comédias clássicas.

Durban comandou uma equipe de pesquisadores em seis experimentos, cinco em laboratório e um em campo, nos quais era testada em voluntários a resistência à dor antes e depois de acessos de riso social.

A dor era provocada de três formas diferentes: passando-se uma garrafa de vinho congelada no antebraço da pessoa, apertando-lhe muito o braço com um aparelho medidor de pressão arterial ou submetendo-a a extenuantes exercícios de esqui, até chegar a um ponto em que ela afirmava ser seu limite. Depois os voluntários passavam por testes e, em seguida, assistiam a trechos de comédias (como Os Simpsons e Friends), programas de conteúdo neutro (como um documentário sobre treinamento de animais e um especial sobre golfe) e outros de conteúdo positivo, mas incapazes de provocar risos (como filmes sobre a natureza).

 

No experimento de campo, os voluntários foram levados a ver apresentações de stand-up comedy. Após essa etapa, os participantes eram novamente submetidos a testes. Em todos esses casos, foram feitos vídeos que documentaram quanto tempo os participantes passaram rindo.

Benefícios do riso

Alergia

O riso reduz reações cutâneas a alérgenos (agentes capazes de produzir alergias) em testes. Também diminui os níveis de anticorpos e melhora o sono.

Artrite reumatoide

Um bom momento de riso reduz os níveis sanguíneos das citocinas próinflamatórias (moléculas envolvidas na emissão de sinais entre as células durante o desencadeamento das respostas imunes que possuem compostos capazes de promover o processo de inflamação) e do hormônio do crescimento, além de aumentar os níveis de citocinas antiinflamatórias. Segundo um estudo da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha), os efeitos podem durar 12 ou mais horas depois do acesso de riso.

Asma/bronquite

O efeito de uma terapia do tipo Doutores da Alegria reduz a hiperinflação (inchaço excessivo) dos pulmões em pacientes graves e muito graves de doença pulmonar obstrutiva crônica.

Depressão

A ioga do riso (uma combinação de riso natural e respiração iogue) funciona tão bem quanto uma rotina de exercícios convencionais para mulheres idosas com depressão, informa um estudo da Universidade Allameh Tabatabai (Irã). Segundo os pesquisadores, nesse caso não há diferença se o riso é espontâneo ou forçado.

Diabete tipo 2

Segundo um artigo publicado no periódico Alternative Therapies in Health and Medicine, o riso pode beneficiar os níveis de glicose no sangue, além de reduzir a quantidade de compostos inflamatórios a ser ingerida. Ele também aumenta os níveis de colesterol bom em pacientes diabéticos de alto risco.

Dor

O riso aumenta os limites da tolerância à dor e ao desconforto. Ele também eleva os níveis de endorfinas, os analgésicos naturais do nosso corpo.

Eczema

Assistir a uma comédia pode melhorar a flora intestinal em pessoas com eczema. Em um estudo realizado em um hospital japonês, várias pessoas assistiram a comédias diferentes e tiveram as fezes analisadas antes e após cada exibição. O riso mudou a constituição das bactérias intestinais nos pacientes que apresentavam eczema.

Estresse

O riso reduz o nível dos hormônios do estresse, como o cortisol, a dopamina, a epinefrina (adrenalina) e o hormônio do crescimento. Por outro lado, eleva o nível de hormônios que reforçam a saúde, como as endorfinas, e de neurotransmissores.

Perda de peso

O riso aumenta entre 10% e 20% o consumo de energia, de acordo com um estudo norte-americano.

Problemas cardíacos

De acordo com um estudo da Universidade de Atenas, o riso reduz a rigidez arterial (um indicador do risco de doença cardiovascular) e os níveis do hormônio do estresse. Outras pesquisas mostram que pessoas com maior propensão a rir têm um risco menor de doenças cardíacas e de sofrer ataques cardíacos. Ele também diminui a incidência de ataques cardíacos em diabéticos de alto risco.

Sistema imunológico

O número de células produtoras de anticorpos e a efetividade das células T são aumentados com o riso, o que reforça todo o sistema imunológico.

 

 

 

Publicados na revista Proceedings of the Royal Society B: Biological Sciences, os resultados comprovaram que rir aumenta a resistência à dor. De acordo com Dunbar, o esforço muscular que ocorre no ato de rir causa um aumento na concentração de endorfinas, neurotransmissores que deflagram um efeito de bem-estar na pessoa.

Para o psicólogo inglês, o riso social se coloca, dessa forma, ao lado de outras atividades favorecidas pela evolução, como a dança e o canto.

Todas elas ajudam a aproximar grupos, produzem endorfinas prazerosas e têm na parte física um componente importante.

“O riso é um mecanismo primitivo para unir grupos sociais”, explica Dunbar. Ele também está presente entre os primatas e, tal como os cuidados individuais, as carícias e a retirada de piolhos, ajuda esses animais a estabelecer e manter laços grupais. A pesquisa do cientista reforça ainda mais a ideia de que rir é um fator de grande importância na recuperação e na manutenção da saúde.

“A terapia do riso deveria ter seu lugar como uma medicina complementar na prevenção e no tratamento de doenças”, confirma o médico espanhol Ramón Mora-Ripoll em um artigo recente na revista Alternative Therapies in Health and Medicine. “Acrescente o riso ao seu trabalho e à sua vida diária, lembre-se de rir regularmente, partilhe suas risadas e ajude outros a rir também.”