01/11/2008 - 0:00
Boa tarde. Meu nome é Papero! Sou o robô de relacionamentos da NEC. É a minha primeira visita ao Brasil e espero causar uma boa impressão a todos.” E certamente causou. De meia em meia hora, cerca de 20 pessoas lotavam o estande da NEC, na Semana Cultural Brasil-Japão, que ocorreu em São Paulo, entre 14 e 22 de junho, em comemoração ao Centenário da Imigração Japonesa no Brasil. Em homenagem ao nosso país, o papai do robô, Junichi Osada, desenvolveu até um samba para o Papero dançar.
Papero é a abreviação de PArtnertype PErsonal RObot. Ele parece um brinquedo, age como criança, na versão Child Care, mas atrai pessoas de todas as faixas etárias. “O Papero é bem-aceito no mundo todo”, comenta Osada com um grande sorriso. Adultos e crianças compartilharam um momento único interagindo com o robô.
Juntos, eles puderam cantar, conversar, tanto em português quanto em japonês, fazer cócegas e beijar o Papero, que fica com as bochechas rosadas ao receber carinho. “Ele é um robô diferente, porque sua base é o toque e a interatividade”, explica Osada. “Muitos robôs são apresentados ao público a distância. Então, as pessoas falam ‘ah, legal’ e vão embora. Já o Papero é demonstrado com o público tocando e se relacionando com ele. Por isso, todos começam a sentir carinho por ele.”
Mas como elaborar um robô que seja aceito praticamente como um membro da família? Essa é a pergunta-chave para as novas pesquisas na área de robótica: a interação homem-máquina. Por enquanto, o Papero e o Aibo, cãozinho-robô da Sony, servem como base de pesquisa. As feições graciosas – sem precisar, necessariamente, ter características humanas –, as frases feitas, o reconhecimento de voz e rosto e a sensibilidade ao toque já mostram como é fácil gostar de um robô. “Teve uma menininha que chorou quando o Aibo desligou. Ela achou que ele havia morrido, mas só tinha acabado a bateria”, conta Flávio Tonidandel, professor e coordenador do curso de ciência da computação do Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana (FEI).
Não se engane. O objetivo não é substituir bichinhos de estimação ou seres humanos por robôs. A idéia é fazer com que essas máquinas facilitem nossas vidas. De acordo com Osada, a finalidade de se construir um robô como o Papero é mudar a interface do computador: não será mais necessário sentarse à frente do aparelho para fazer uma pesquisa simples, como as de trânsito e previsão do tempo. “Você pode perguntar para o Papero: ‘Vai chover?’, que ele responde: ‘Olha! Se eu fosse você, levaria um guarda- chuva!’”, exemplifica Márcia Emiko Shinotsuka, coordenadora de comunicação da NEC.
Tonidandel também acha que os robôs não substituirão os seres humanos nem tomarão o emprego de um deles. “Acredito que o que vai acontecer será uma requalificação dos funcionários. Aquele que executava o trabalho do robô passará a operá-lo ou a ajudar a construí-lo.”
Construir um robô, aliás, é uma tarefa árdua. É isso que alunos das faculdades de engenharia estudam durante anos. De acordo com Tonidandel, a maior dificuldade na elaboração de um robô é a parte da mecatrônica, que envolve três áreas: mecânica (como o robô será estruturado e como se moverá), eletrônica (como serão os mecanismos que o farão funcionar e o controlarão) e computação (como se dará a interação do robô com o ambiente, sua funcionalidade e sua inteligência na movimentação).
ROBÔS, DA FICÇÃO À VIDA REAL
O termo robô veio de uma palavra tcheca, que significa trabalho forçado. Ele foi usado pela primeira vez na peça de teatro de Karel Capec chamada R.U.R – Rossum Universal Robot, em 1920. Na trama, o cientista Rossum criava humanos mecânicos que faziam exercícios pesados e repetitivos batizados de Robot. Quatro anos depois, surgiu o primeiro robô, feito por Roy J. Wensley. Era um dispositivo acoplado a um sistema de telefonia que podia ligar e desligar as máquinas que estivessem conectadas a ele. Três anos depois, Wensley criou o Televox, com aspecto humano e que conseguia executar movimentos básicos. Os robôs começaram a se popularizar com o Willie Vocalite, em 1930. Ele tinha dois metros de altura e parecia aqueles robôs do mal de filmes antigos. Em 1937, nasceu Elektro, um astro de cinema. Ele andava, movia a cabeça e a boca e tinha sensores fotoelétricos nos olhos que lhe permitiam distinguir o vermelho do verde. Não tardou muito até o Elektro ganhar um mascote: o robô-cão Sparko. Juntos, participaram de feiras, show e até filmes, como Sex kittens go to college.Mais tarde, novos estudos foram feitos e a robótica foi se aperfeiçoando. Desde os anos 1980, empresas como Honda, Sony e NEC têm investido muito em pesquisas na área. Hoje, já temos o Asimo, da Honda; o Papero, da NEC; e o Aibo, da Sony, por exemplo.
Atualmente, os robôs com alta interação possuem câmeras e microfones, permitindo que reconheçam o rosto e a voz do seu interlocutor. Os estudantes da FEI instalaram no Aibo esses sensores. O Papero possui esses dispositivos e também é capaz de se conectar à internet e operar aparelhos domésticos, como televisão, microondas.
As crianças se encantaram com o Papero, que conversou com elas em português e em japonês. Em troca, ele ficou “corado” com tantos beijos que ganhou. Abaixo, Junichi Osada, o pai do robô.
Mesmo com todos esses avanços tecnológicos, Osada concorda que a interatividade dos robôs ainda precisa ser estudada. Ele ressalta também que fazer uma equipe entrar em consenso é um grande obstáculo. “Além de começarmos do zero, já que não havia muitos estudos sobre robô, a equipe era muito grande. Tinha grupos de técnicos mecatrônicos, de comunicação e designers – cada um defendendo um ponto de vista diferente.”
Apesar de ser uma área muito desenvolvida nos Estados Unidos e no Japão, a robótica caminha em alta velocidade aqui no Brasil. E qual é a especialidade dos robôs brasileiros? O futebol, claro! Todo ano, alunos de faculdades de engenharia disputam a Copa de Futebol de Robôs do Brasil. As instituições que estão sempre na liderança são FEI, Faculdade Mauá, Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Bauru e Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRGN). “Essas competições não são disputas para vermos quem é o melhor”, afirma Tonidandel. “Não temos essa rivalidade tipo Palmeiras e Corinthians.”
“Se ganhamos por conta de uma nova tecnologia, nós a distribuímos para os demais logo após o término do campeonato”, ressalta o professor. Os times também visitam as outras equipes para se atualizar e trocar figurinhas. Esta colaboração mútua e amistosa faz com que os estudos de robótica cresçam no País. “Todos os nossos artigos são publicados na internet com o intuito de promover a ciência e a tecnologia. É para ninguém ter de partir do zero”, esclarece.
O novo robô criado pelos alunos da FEI é um jogador de futebol cilíndrico. Sua versão anterior (ao lado) já esteve em vários campeonatos.
O novo robô criado pelos alunos da FEI é jogador de futebol cilíndrico, que tem mais capacidade de movimento e velocidade. Além do futebol, eles desenvolvem outros projetos, como Mike, o robô humanóide que demonstra emoções, e o robô hexápode, de seis pernas. “Outros planos futuros são o robô baterista, capaz de ouvir música e reproduzir apenas o som da bateria, e um robô humanóide para pesquisas”, antecipa Tonidantel.
O ROBÔ CIRURGIÃO
Este ano, o Hospital Sírio-Libanês investiu R$ 5 milhões na implantação de um robô cirúrgico, chamado de Da Vinci. Em março, já eram realizadas cirurgias de próstata e endometriose. Os médicos responsáveis pelas primeiras cirurgias foram Anuar Mitre e Miguel Srougi, da USP, que classificam o feito como “uma nova fase da cirurgia”. De acordo com Srougi, a técnica torna a intervenção menos invasiva.
O robô cirúrgico possui quatro braços – um para gravar vídeo e três para manusear os instrumentos. O médico fica numa mesa de controle, com dedais acoplados, utilizados para orientar o robô. No mundo, menos de mil máquinas dessas são usadas em cirurgias – 700 nos Estados Unidos, 150 na Europa e o restante no Oriente Médio.
Os andróides superdesenvolvidos que aparecem em obras de ficção como Eu, robô e O homem bicentenário, de Isaac Asimov, não serão vistos por nós tão rapidamente. Mas a idéia agora é os robôs ajudarem cada vez mais os humanos. “A tendência é que carros e casas se adaptem às preferências dos usuários”, argumenta Tonidandel. Um carro que o leva para onde você quiser, sem que você precise dirigir; ou uma casa que saiba a quantidade de iluminação que você prefere. “Outro passo, um tanto quanto largo, digamos assim, é o desenvolvimento da inteligência artificial. Já existem pesquisas, aqui no Brasil, acerca do raciocínio espacial dos robôs. Eles conseguem detectar um objeto escondido atrás do outro, por exemplo.”
