Era 1955 nos Estados Unidos: as emissoras de rádio tocavam repetidamente o sucesso de Bill Haley “Rock around the clock”; a comédia O pecado mora ao lado, com Marilyn Monroe, estreava em Nova York; e na televisão logo seria lançada a série de faroeste Gunsmoke. No mesmo ano nasceram americanos famosos, como Bill Gates, Bruce Willis e Whoopi Goldberg. E foi também em 1955 que Emmett Till, um menino negro de 14 anos, foi brutalmente assassinado no sul do país por dois homens brancos.

Os protestos que se seguiram à absolvição de seus assassinos marcaram o início do movimento pelos direitos civis dos negros – juntamente com outro episódio importante da resistência negra, o “Boicote aos ônibus de Montgomery”, que por sua vez está ligado a uma mulher nascida em 4 de fevereiro de 1913: Rosa Parks.

Segregação levou à resistência

O racismo era um triste cotidiano no sul dos Estados Unidos na época. As pessoas eram separadas umas das outras com base em características físicas. Havia escolas e bancos de praça para negros e para brancos.

Também eram claras as regras para o uso do transporte público: no ônibus, os assentos da frente eram reservados para brancos, e negros deviam se sentar atrás. Estes tinham que pagar a passagem ao motorista e depois dar a volta no veículo para entrar pela porta traseira. Eles até eram tolerados nos assentos do meio, desde que se levantassem caso brancos quisessem se sentar ali.

Naquela época, Rosa Parks trabalhava como costureira numa loja de departamentos de Montgomery, Alabama, no sul dos Estados Unidos. Quando pegou o ônibus amarelo e verde para voltar para casa após o trabalho em 1º de dezembro de 1955, ela não tinha ideia de que aquela quinta-feira entraria para a história.

Parks tinha 42 anos, era casada, destemida e ativista de longa data da Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor (NAACP, na sigla em inglês), uma organização que defende os direitos civis dos negros.

Quando foi solicitada a se levantar de seu assento para dar lugar a um homem branco, ela simplesmente ficou sentada. Mesmo quando o motorista do ônibus ameaçou prendê-la, ela manteve a calma e respondeu: “Você pode fazer isso.” Pouco tempo depois, ela foi detida pela polícia.

Imediatamente após a prisão, o Conselho de Mulheres de Montgomery circulou um pedido de boicote entre a comunidade negra. Os negros deveriam evitar todos os ônibus da cidade na segunda-feira, quando ocorreria a audiência de Parks, e, em vez disso, caminhar ou pegar um táxi. Quase todos os negros participaram. Parks foi condenada a pagar uma multa de 14 dólares por “conduta imprópria” e “violação de leis locais”.

Martin Luther King apoiou o protesto

O boicote teve continuidade, e um pastor relativamente desconhecido na época desempenhou um papel significativo no protesto pacífico: Martin Luther King tinha 20 e poucos anos e coordenava o boicote. E assim fez inimigos. Ele sobreviveu a dois atentados, mas persistiu em sua missão de pregar a resistência não violenta.

Em 13 de novembro de 1956, a Suprema Corte dos Estados Unidos suspendeu a segregação racial no transporte público, encerrando o boicote de quase 380 dias.

Foi uma primeira grande e importante vitória para o movimento dos direitos civis. Ela mostrou que vale a pena lutar: unidos, sem violência e contra todas as adversidades. Essa experiência moldou Martin Luther King. Como presidente do movimento de direitos civis Conferência da Liderança Cristã do Sul (SCLC, na sigla em inglês), que surgiu do boicote aos ônibus em Montgomery, ele iniciou alguns anos depois a Marcha em Washington por Empregos e Liberdade junto com outras organizações. Foi quando fez seu famoso discurso “Eu tenho um sonho”, diante de 200 mil pessoas.

Rosa Parks: tornar o mundo um lugar melhor

“Eu não tinha ideia de que isso se transformaria em tanto”, lembrou Rosa Parks mais tarde. “Meus pés doíam e não sei por que me recusei a levantar. Mas o verdadeiro motivo foi que senti que tinha o direito de ser tratada como qualquer outro passageiro.”

Parks não foi a primeira mulher a ousar defender seu lugar no ônibus e na sociedade, mas a integridade e a proximidade dela com a NAACP, onde atuou como secretária voluntária, tornaram seu caso um precedente. Ela estava pronta para passar por todas as instâncias e determinada a tornar o mundo um lugar melhor, um lugar onde todos pudessem viver em liberdade.

“Desde que me lembro, eu sabia que havia algo errado com nosso modo de vida quando as pessoas podiam ser maltratadas por causa da cor de sua pele”, disse ela em uma reunião da NAACP em 1956. Ela estava cansada de ceder, de se submeter a regras que considerava erradas. A decisão de não se levantar no ônibus não foi, portanto, um impulso espontâneo, mas uma consequência lógica.

Efeitos na vida futura de Rosa Parks

No entanto, a liberdade pela qual Parks lutou foi tirada dela. Ela não estava mais segura em Montgomery. Após perder o emprego e receber ameaças de morte, ela fugiu com o marido para Detroit, para a casa do irmão. Lá, encontrou emprego como costureira e continuou a lutar pelos direitos e liberdades civis. A partir de 1965, Parks passou a trabalhar como secretária do congressista negro John Conyers, até se aposentar.

Rosa Parks se tornou um ícone do movimento pelos direitos civis. Desde 1998, alguns estados americanos comemoram o Rosa Parks Day (Dia de Rosa Parks), alguns em 1º de dezembro, outros em 4 de fevereiro, aniversário dela. Neste sábado (04/02), Parks completaria 110 anos.

Quando a casa em Detroit onde ela se refugiou estava prestes a ser demolida em 2016, sua sobrinha a comprou e encarregou o artista americano Ryan Mendoza de desmontá-la e reconstruí-la em Berlim.

Dois anos depois, voltou aos EUA, para em 2020 ser instalada em Nápoles. A própria Parks não chegou a vivenciar isso. Ela morreu em 2005, aos 92 anos, e se tornou a primeira mulher afro-americana a ser homenageada com uma estátua no Capitólio dos Estados Unidos.