Mas os governos ainda podem mudar esse prognóstico sinistro.

as ameaças ambientais à saúde humana, nem a falta de saneamento básico ou a escassez de água potável serão tão letais, em médio prazo, quanto a poluição do ar nas cidades. De acordo com um relatório divulgado em março pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que avalia as condições ambientais da Terra até 2050 – ano em que 70% da população mundial estará urbanizada –, 3,6 milhões de pessoas morrerão prematuramente, a cada ano, por exposição a material particulado – a maioria nas superpopulosas China e Índia.

A meses da Rio+20, o relatório Environmental outlook 2050: the consequences of inaction assinala quatro fatores relevantes para o agravamento da poluição global: mudança climática, perda da biodiversidade, escassez de água e impactos na saúde. As projeções foram feitas sob a perspectiva de um “cenário de entrega” – a expressão usada por Simon Upton, diretor de meio ambiente da OCDE, para definir aonde o planeta chegaria “se os governos não tomarem medidas realmente efetivas”.
O resultado não é animador: insistir no curso atual, sem efetuar mudanças, acarretará uma geração de emissões de gases de efeito estufa muito além dos níveis cientificamente aceitos como seguros – cerca de 50%, no caso de a demanda de energia elétrica subir acentuadamente sem incorporar fontes renováveis.

O estudo acompanha em detalhe as projeções sobre o ozônio troposférico (encontrado no nível do solo) e o material particulado MP10 (partículas inaláveis com diâmetro aerodinâmico menor que 10 micrometros), associados a doenças respiratórias e cardiovasculares. Até 2050, as concentrações de MP10 emitidas por centrais elétricas, indústrias e veículos a motor tenderão a cair em cidades de países ricos, no Brasil e na Rússia, mas, em termos mundiais, ainda ficarão bem acima dos índices de qualidade do ar recomendados internacionalmente.
Com o aumento da urbanização, o ozônio troposférico (no nível do solo), originário de indústrias químicas, centrais elétricas, tintas, veículos motorizados e caldeiras industriais, promete afligir a Índia e os países ricos. A situação é preocupante para estes últimos em virtude de sua composição etária, caracterizada por um percentual significativo de idosos – exatamente a faixa mais suscetível ao impacto do problema. Ainda segundo os cientistas, o “cenário de entrega” acarretaria um incremento na temperatura média do planeta entre 3°C e 6°C em 2100.

A OCDE prevê que a demanda de água deverá registrar um aumento robusto, de mais de 50%. Com isso, em 2050 cerca de 40% da população mundial poderá estar vivendo em bacias de drenagem submetidas a sério estresse hídrico, especialmente na África e na Ásia. Superexigidas, as reservas de água subterrânea tendem a se exaurir, o que trará prejuízos à agricultura e ao abastecimento das cidades. Para complicar, a poluição proveniente de esgotos e águas residuais (como a originária de produtos químicos usados em limpeza) representará uma ameaça adicional à produção de alimentos.

Em 2050, a demanda de energia será aproximadamente 80% maior que a atual. A OCDE calcula que 85% da produção será de combustíveis fósseis, o que representa emissões ainda maiores de gases de efeito estufa. A entidade prevê ainda que a mudança climática levará à extinção de 10% da fauna selvagem e a perdas de espécies de água doce ainda maiores do que a redução de 33% já constatada. Apesar de a área ocupada por florestas tender a aumentar, as matas nativas deverão perder 13% de seu território. O acréscimo virá de espaços reflorestados, habitados por menos espécies.

O cenário é desanimador, mas a OCDE acredita que pode ser substancialmente mudado. Para tanto, sugere algumas ações rápidas aos governos. A entidade observa, por exemplo, que diversos países dão isenções fiscais a veículos que consomem diesel. Embora emitam menos gases estufa que os carros à gasolina, os queimadores de diesel lançam no ar uma quantidade bem maior de MP10, indesejável nos centros urbanos. “Em termos ambientais, não há razão para se dar incentivos fiscais ao diesel em relação à gasolina”, afirma Upton.
O especialista sugere a adoção de outras medidas que onerem a produção de poluição. Essas deveriam incluir a eliminação de subsídios a combustíveis fósseis e à água que estimulam o uso irrefletido do recurso, uma regulação mais efetiva do tema e a criação de uma “taxa de carbono”. A propósito, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, tem buscado aprovar no Congresso propostas para cortar os subsídios aos combustíveis fósseis no país, calculados entre US$ 10 bilhões e US$ 40 bilhões anuais, mas até agora não teve sucesso. Por outro lado, as inovações que impulsionam a implantação de uma economia mais verde devem ser estimuladas.

Os biocombustíveis são um assunto polêmico, salienta Upton. Enquanto representam emissão menor de carbono ante os combustíveis fósseis, ajudam a reduzir a biodiversidade e a aumentar o consumo de água. Seguir pela estrada dos biocombustíveis exigiria uma cuidadosa reflexão dos governos envolvidos.
O diretor de meio ambiente da OCDE considera que a adoção de medidas de execução rápida pelos governos e de uma perspectiva de longo prazo aumentariam as chances de melhorar o cenário geral. Segundo Upton, é fundamental consolidar uma visão integrada do tema, que aborde todas as suas vertentes principais e interconexões. “Os quatro maiores vetores de poluição estão interligados. A biodiversidade, por exemplo, é afetada pela mudança climática e o uso do solo, assim como a água está relacionada a problemas de saúde. Não é possível resolver qualquer um desses aspectos isoladamente”, ressalta Upton.