25/11/2025 - 17:27
Em meio a avanços territoriais russos e enfraquecido por escândalo de corrupção, presidente ucraniano vem sendo pressionado por Trump a aceitar plano de paz cujo texto original foi classificado como “capitulação” do paísO presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, passa por dias decisivos, que vão testar sua capacidade de se manter firme em posições que a Ucrânia considera inegociáveis diante da pressão dos Estados Unidos pelo fim da guerra iniciada há quase quatro anos pela Rússia.
Os EUA surpreenderam a liderança ucraniana e os seus aliados europeus com o plano de paz de 28 pontos apresentado na semana passada e que dava à Ucrânia até esta quinta-feira (27/11) para concordar com um arcabouço para encerrar a guerra.
A iniciativa repentina do presidente Donald Trump elevou a pressão sobre Zelenski no seu momento de maior vulnerabilidade devido a um escândalo de corrupção no seu governo e aos contínuos avanços territoriais da Rússia.
Um alto funcionário do governo americano disse à agência de notícias AFP, sob condição de anonimato, que os Estados Unidos pressionaram a Ucrânia a aceitar o plano original – apesar de ele conter demandas inaceitáveis do ponto de vista ucraniano. Em Kiev, o plano original chegou a ser comparado a uma “capitulação” da Ucrânia.
Zelenski certamente teria dificuldades em convencer os ucranianos a aceitar um acordo visto como uma traição aos interesses do país.
Após o vazamento do plano e diante do ultimato dado à Ucrânia, líderes ucranianos e europeus fizeram uma série de declarações, nas quais agradeceram a Trump por seus esforços para encerrar a guerra, mas afirmaram ser necessário considerar mais o lado ucraniano.
Os europeus disseram que acolheram bem o plano e afirmaram que ele continha “elementos importantes” e que poderia ser usado como uma base para “trabalho adicional”. O presidente francês, Emmanuel Macron, alertou, porém, contra uma capitulação por parte de Kiev.
Modificações no plano em Genebra
Ao longo do fim de semana, os Estados Unidos e a Ucrânia alteraram significativamente o controverso plano de paz de 28 pontos para encerrar a guerra da Ucrânia apresentado por Trump, disseram negociadores que participaram das conversações em Genebra, na Suíça.
O plano inicial de Trump, que aliados europeus viram como uma lista de desejos do Kremlin, vazou para a imprensa americana na quinta-feira passada e disparou o alarme em Kiev e em capitais europeias por se alinhar fortemente às exigências de Moscou na guerra de quase quatro anos provocada pela invasão russa.
O plano pressionava a Ucrânia a ceder não só territórios ocupados à Rússia quanto áreas sob controle de Kiev, além de obrigar os ucranianos a reduzir suas Forças Armadas a um máximo de 600 mil militares. O plano ainda pedia a Kiev que abandonasse qualquer esperança de responsabilizar a Rússia pela invasão ou de ingressar na Otan.
Nesta segunda-feira, Zelenski, após ser informado por sua equipe de negociação sobre os resultados das consultas em Genebra, confirmou que o documento, que inicialmente tinha 28 pontos, foi reduzido.
Zelenski disse que foram levadas em conta muitas questões levantadas pela Ucrânia e que ele mesmo abordará os tópicos mais delicados numa conversa com Trump nos próximos dias. Segundo o jornal britânico Financial Times, a versão atual do plano de paz tem 19 pontos.
Embora essa versão não tenha sido divulgada, negociadores disseram ao jornal The New York Times que alguns dos pontos mais sensíveis, incluindo limites para o tamanho das Forças Armadas ucranianas e a proibição do deslocamento de tropas da Otan para território ucraniano, foram deixados para negociações futuras. O mesmo ocorreu com a questão de onde seriam traçadas as novas fronteiras entre a Rússia e a Ucrânia.
O Kremlin destacou estar ciente de que o texto original sofreu alterações, mas ressalvou que não foi oficialmente comunicado sobre quais seriam e que o plano original de Trump é o “único documento que poderá servir como uma base muito boa para as negociações”.
O ministro do Exterior da Rússia, Serguei Lavrov, acusou os países europeus de tentarem minar os esforços diplomáticos de Trump. “Os pontos-chave do plano de Trump baseiam-se nos entendimentos alcançados em Anchorage. E esses princípios figuram, em linhas gerais, no plano, o que nós saudamos”, disse, em alusão à cúpula russo-americana realizada em agosto no Alasca.
Escândalo de corrupção afeta Zelenski
Zelenski enfrentou na semana passada uma rebelião sem precedentes de seus próprios parlamentares, depois que investigadores revelaram um escândalo de corrupção de 100 milhões de dólares envolvendo altos funcionários ucranianos.
Apesar do escândalo, Zelenski enviou a Genebra o chefe do gabinete presidencial, Andrii Yermak, minimizando a intensa pressão interna para demiti-lo. Embora Yermak não tenha sido acusado de qualquer irregularidade, vários parlamentares do partido de Zelenski disseram que ele deveria assumir a responsabilidade pelo escândalo para restaurar a confiança da população. Alguns disseram que, se Zelenski não o demitisse, o partido poderia se dividir, ameaçando a maioria parlamentar do presidente.
Mas Zelenski resistiu, dizendo que Yermak era fundamental para as negociações de paz, de acordo com um importante parlamentar do partido, que falou sob condição de anonimato. Na sexta-feira, diante da pressão do EUA, Zelenski pediu aos ucranianos que se unissem e “parassem com os jogos políticos”.
Pressão na frente de batalha
Em meio a isso, os militares russos, mais bem equipados, intensificaram os ataques ao longo da linha de frente e contra instalações de energia na retaguarda, aumentando ainda mais a pressão sobre Zelenski.
O exército russo continua avançando de forma constante em diversas áreas. As forças russas estão avançando em direção às cidades de Kupiansk e Pokrovsk, onde ocorrem as batalhas mais ferozes.
Os ataques russos às usinas de energia da Ucrânia em novembro resultaram em alguns dos piores apagões desde o início da guerra. Depois que a Rússia destruiu grande parte da capacidade de extração de gás da Ucrânia em dois ataques em massa neste ano, a empresa estatal de gás, Naftogaz, teve que levantar fundos emergenciais para importar gás caro.
Nesta terça-feira, ao menos seis pessoas foram mortas em Kiev num ataque russo com mísseis e drones que destruiu vários prédios em áreas residenciais da capital, de acordo com as autoridades ucranianas.
Zelenski afirmou que a Rússia não irá reduzir a pressão sobre a Ucrânia. “Nas próximas semanas, devemos estar muito atentos aos alertas de ataques aéreos”, insistiu.
Negociações continuam
Negociadores dos Estados Unidos e da Rússia iniciaram nesta segunda-feira reuniões em Abu Dhabi sobre o plano para terminar a guerra na Ucrânia, noticiou a imprensa dos Estados Unidos e do Reino Unido.
A emissora ABC News e o Financial Times noticiaram que o secretário do Exército, Dan Driscoll, lidera a delegação dos Estados Unidos. O FT acrescentou, com base em duas pessoas próximas das discussões, que o líder dos serviços de informações militares ucranianos GUR, Kyrylo Budanov, participa das negociações.
Em Kiev, autoridades ucranianas disseram que Zelenski poderá viajar ainda esta semana aos Estados Unidos para negociações com Trump sobre o fim da guerra com a Rússia.
Os chefes da diplomacia dos países da União Europeia vão se reunir informalmente nesta quarta-feira por videoconferência para debater as negociações de paz, disseram diplomatas europeus.
O chanceler federal da Alemanha, Friedrich Merz, afirmou no domingo, em entrevista à DW, não acreditar que haverá um acordo sobre a paz na Ucrânia até a próxima quinta-feira, como previa o ultimato dado por Trump.
