Mais de US$ 1 milhão provenientes da sociedade no mundo são gastos por minuto em subsídios agrícolas, muitos dos quais estimulam o aquecimento global e a destruição da vida selvagem, segundo um relatório publicado recentemente pela Food and Land Use Coalition (Folu) e noticiado pelo jornal “The Guardian”. A Folu reúne organizações e indivíduos de diversos países interessados em transformar rapidamente a maneira como produzimos e consumimos alimentos e como usamos a terra em termos de pessoas, clima e natureza.

Dos US$ 700 bilhões destinados anualmente aos agricultores, apenas 1% é usado para beneficiar o meio ambiente, segundo o trabalho, intitulado “Growing Better: Ten Critical Transitions to Transform Food and Land Use”. Grande parte do valor total promove a pecuária feita com altas emissões de gases-estufa, a destruição de florestas e a poluição pelo uso excessivo de fertilizantes.

Segundo o relatório, a segurança da humanidade está ameaçada se não houver reforma desses subsídios, uma grande redução no consumo de carne nos países ricos e outros usos prejudiciais da terra. Mas redirecionar os subsídios para armazenar carbono no solo, produzir alimentos mais saudáveis, cortar resíduos e cultivar árvores é uma grande oportunidade, afirma.

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O relatório rejeita a ideia de que subsídios são necessários para fornecer alimentos baratos. Ele constatou que o custo dos danos atualmente causados ​​pela agricultura supera o valor dos alimentos produzidos. Segundo as avaliações feitas, a produção de alimentos saudáveis ​​e sustentáveis ​​reduziria os preços dos alimentos, conforme as condições da terra melhorassem.

Insanidade

“Existe uma miríade direta incrivelmente pequena de [subsídios para] resultados ambientais positivos, o que é insano”, disse Jeremy Oppenheim, diretor da Folu. “Temos que mudar esses subsídios em medidas explicitamente positivas.”

Segundo ele, o total global real provavelmente é de US$ 1 trilhão por ano, pois é difícil quantificar alguns subsídios com precisão. “Esse trilhão de dólares de financiamento público está disponível e é uma alavanca massiva para incentivar a comunidade agrícola do mundo a agir diferentemente”, afirmou.

O novo estudo reforça o conceito expresso em vários estudos recentes de que o sistema alimentar mundial está quebrado. Segundo um relatório divulgado em novembro pela InterAcademy Partnership (IAP), reunindo 130 academias nacionais de ciência e medicina, do jeito que está, esse sistema está levando a Terra à catástrofe climática, deixando milhares de milhões de pessoas subnutridas ou obesas. Outro estudo internacional revelou que, como o gado usa 83% das terras agrícolas para produzir apenas 18% de calorias, evitar carne e laticínios é a maior maneira de reduzir seu impacto ambiental no mundo.

A “dieta de saúde planetária” publicada por cientistas em janeiro exige um corte de 80% na carne vermelha consumida por europeus e norte-americanos. A adoção dessa dieta nas próximas décadas significaria que 60% das pastagens atuais – uma área semelhante à do Brasil – poderiam ser usadas para a vida selvagem ou outros fins.

Falta de exemplos

Mas a implementação dessas recomendações ainda parece distante, reconheceu Oppenheim. “Não encontramos exemplos de governos que usem seus instrumentos fiscais para apoiar diretamente a expansão da oferta de alimentos mais saudáveis ​​e nutritivos”, afirmou.

Segundo o estudo, a maneira prejudicial como o mundo produz alimentos e usa a terra causa US$ 12 bilhões por ano em custos ocultos para o meio ambiente, a saúde humana e o desenvolvimento. “Continuar nas tendências atuais significa sonambulismo em um cenário em que as mudanças climáticas ameaçam cada vez mais a vida humana, a biodiversidade e os recursos naturais são esgotados, as pessoas sofrem cada vez mais doenças com risco de vida, induzidas pela dieta, a segurança alimentar seria comprometida e [a redução da pobreza] seriamente prejudicada”, afirmou Oppenheim. “Esse caminho, em poucas décadas, ameaçaria nossa segurança coletiva.”

Por outro lado, transformar os sistemas de uso de alimentos e terra na próxima década é uma oportunidade notável, segundo o diretor da Folu. Isso pode gerar um retorno social mais de 15 vezes o custo de investimento necessário, estimado em menos de 0,5% do PIB global.

A transformação do uso de alimentos e da terra também tornaria o suprimento de alimentos mais seguro, disse Oppenheim. “Continue no modelo que temos e você pode estar razoavelmente confiante de que nos próximos 20 anos teremos vários picos de preços de alimentos relacionados ao clima, porque temos um sistema altamente concentrado, com um pequeno número de [regiões] absolutamente críticas para o suprimento de grãos.”