26/06/2025 - 12:49
Prática arriscada e ilegal, que foi comum no RJ e SP nos anos 90, passa por nova onda turbinada pelas redes sociais. Em Nova York, número de detidos surfando trens subiu 70% e prática deixou 6 mortos na cidade em 2024.Eles são em geral jovens em busca de adrenalina e afirmação entre seus pares. Agachados ou em pé, posicionando os braços como se estivessem surfando uma onda, eles enfrentam o perigo mortal de quedas e choques. Tudo isso sobre os tetos de vagões de metrô ou trens metropolitanos.
O “surfe ferroviário” não é um fenômeno novo no mundo – há registros em Nova York já em 1904, e Berlim teve uma onda na década de 1990, logo após a queda do muroque dividia a cidade.
No Brasil, a prática ganhou o noticiário nas décadas de 1980 e 1990 e envolveu principalmente trens do Rio de Janeiro e São Paulo. À época, era comum a imprensa destacar mortes quase diárias de jovens nas redes de transporte ferroviário.
E há sinais de que a arriscada moda esteja em alta novamente em diversas cidades do mundo, agora incentivada por vídeos postados em redes sociais, especialmente o TikTok.
Adolescentes são a maioria das vítimas
Em Nova York, um dos atuais focos mundiais do surfe ferroviário, seis pessoas morreram realizando a prática ilegal em 2024 e cinco em 2023 – alta expressiva em relação ao período de 2018 a 2022, quando no total cinco pessoas morreram.
A tendência também se reflete no número de pessoas detidas enquanto estavam sobre os trens: em 2023 foram 229, 70% a mais do que as 135 do ano anterior. A maioria deles são garotos, com idade média de 14 anos, segundo a polícia local.
Uma das seis pessoas que morreram no ano passado em Nova York foi o menino Cayden Rivera, de apenas 11 anos. Ele havia sido deixado na sua escola no Brooklin pela avó às 7h45, mas deu um jeito de matar a aula, pegou um trem para o sul, escalou até o teto e, por volta das 10h, caiu nos trilhos e morreu no local.
Sua mãe, Jaida, relatou ao jornal britânico The Guardian que algumas vezes havia confiscado o celular do filho, mas que a primeira coisa que aparecia quando ele abria seu TikTok eram vídeos de pessoas fazendo surfe ferroviário.
Pressão sobre plataformas e campanha publicitária
Em 2023, o prefeito de Nova York, Eric Adams, convocou uma reunião com representantes das principais redes sociais e disse que elas estavam “ferindo nossas crianças” ao permitir que elas assistissem a vídeos de surfe ferroviário, e pressionou as empresas a fazerem um controle mais efetivo do conteúdo.
Desde então, segundo o jornal, 3 mil vídeos do tipo haviam sido deletados, dos quais mais de 1.800 apenas neste ano.
A Autoridade Metropolitana de Transporte (MTA, na sigla em inglês) de Nova York relatou em outubro passado que monitorava diariamente vídeos de surfe ferroviário postados em redes sociais e solicitava às plataformas sua remoção. “Temos feito muito para reverter essa tendência terrível e perigosa”, afirmou o presidente da entidade, Janno Lieber.
O governo local também lançou uma campanha publicitária para desestimular as pessoas a fazerem surfe ferroviário, e começou a usar drones para monitorar algumas das linhas.
Outras medidas que vêm sendo debatidas é fazer modificações nos trens para que seja mais difícil escalá-los até o teto e instalar câmeras e sensores para identificar quando há alguém sobre os vagões.
Alta de casos também na Alemanha
O surfe ferroviário também vem ganhando adeptos em cidades alemãs. Em Hamburgo, foram registrados 40 casos no ano passado, quatro vezes mais do que em 2019. Em Munique, foram quatro casos apenas desde abril.
Em Berlim, dois jovens, um de 17 anos e outro de 18, morreram em abril enquanto surfavam um trem metropolitano S-Bahn e colidiram contra um poste de sinalização entre as estações Schlachtensee e Wannsee, no sul da cidade. Em fevereiro, outro garoto de apenas 12 anos também sofreu ferimentos graves ao colidir contra uma ponte, também próximo da estação Wannsee.
Uma reportagem publicada no último sábado pela revista alemã Der Spiegel entrevistou um ex-surfista ferroviário de 22 anos que largou o que ele descreveu ser um vício, depois de quase morrer em 2023 ao tomar um choque após escalar um trem na cidade de Augsburg. Devido à alta tensão dos cabos, é possível tomar um choque fatal mesmo sem um toque direto neles.
Ele próprio tinha um perfil no qual postava vídeos de suas ações no teto de trens, e relatou que as redes sociais têm enorme influência para atrair novos adeptos, especialmente entre os mais jovens, que ainda não têm plena consciência dos riscos envolvidos.
Nos anos 2010, um coletivo de artistas de Berlim, o Berlin Kidz, que faz intervenções com parkour e grafite, ganhou notoriedade por divulgar filmes de suas ações surfando trens da cidade. Em um deles, um jovem pula do teto de um vagão amarelo do U-Bahn que transitava por uma via elevada para mergulhar direto em um dos canais aquáticos que cruzam a capital alemã.
Uma busca feita nesta quinta-feira no TikTok a partir da Alemanha mostra inúmeros vídeos da prática. Mas um dos primeiros resultados é um post da Deutsche Bahn, a estatal ferroviária do país, com uma policial que alerta para o perigo de surfar trens.
jps/bl (ots)