22/07/2022 - 9:11
Comitê parlamentar que investiga ataque à sede do Congresso americano afirma que, em vez de agir para conter extremistas, ex-presidente “despejou gasolina no fogo” ao insistir na falsa alegação de fraude na eleição.Apesar dos apelos de assessores, aliados, parlamentares republicanos e até de sua família, Donald Trump recusou-se a agir para sustar a invasão do Capitólio por uma multidão de apoiadores em 6 de janeiro de 2021. A conclusão é da comissão parlamentar que investiga o ataque.
Em vez disso, o então presidente dos Estados Unidos “despejou gasolina no fogo” ao tuitar agressivamente suas falsas alegações de que houve fraude nas eleições presidenciais, celebrando seus apoiadores como “muito especiais”.
“O presidente escolheu não fazer o que todo mundo lhe implorou que fizesse”, disse a congressista Elaine Luria durante a oitava audiência pública sobre o caso, realizada na noite desta quinta-feira (21/07) em Washington e transmitida em horário nobre na televisão americana.
Naquele 6 de janeiro, após um discurso incendiário de Trump, que não aceitava a derrota no pleito de novembro de 2020, uma turba de extremistas de direita invadiu, ocupou e depredou a sede do Congresso dos EUA, considerado o coração da democracia americana, deixando um saldo de cinco mortos e dezenas de feridos.
Na ocasião, políticos que compõem o Congresso estavam reunidos para oficializar a vitória do democrata Joe Biden nas eleições presidenciais. O então vice-presidente Mike Pence presidia a sessão parlamentar.
Mesmo no rescaldo da violência e de vários mortos, o presidente não cedeu. Horas após o início da invasão, Trump declarou novamente: “Não quero dizer que a eleição acabou”, segundo mostrou o trecho de um discurso à nação exibido durante a audiência.
A comissão apresentou imagens inéditas e sem edição do discurso, em que Trump se recusou a ler a declaração preparada por sua equipe e, em vez disso, improvisou, insistindo aos invasores que a eleição havia sido roubada.
O intuito dos parlamentares foi documentar como, durante 187 minutos – desde que Trump deixou o palco de um protesto em que conclamou apoiadores a marcharem rumo ao Capitólio até o momento em que apareceu no Jardim de Rosas para o discurso improvisado –, nada convenceu o presidente a agir.
Em vez disso, ele passou horas na sala de jantar da Casa Branca assistindo ao ataque pela emissora Fox News e fazendo telefonemas a senadores pedindo-lhes que adiassem a certificação do resultado do pleito.
“O presidente Trump não falhou por inação, ele escolheu não agir”, reiterou o congressista republicano Adam Kinzinger, um dos membros que comandaram a audiência.
“Um tuíte terrível”
As mensagens que o então presidente publicou no Twitter foram consideradas incendiárias por seus próprios assistentes. Um dos tuítes repetia a alegação infundada de fraude eleitoral e criticava o vice-presidente Mike Pence – principal alvo da fúria dos invasores – por não ter suspendido a certificação da vitória de Biden.
“Era óbvio que a situação estava violenta e o tuíte sobre o vice-presidente era a última coisa de que precisávamos”, disse a vice-secretária de Comunicação da Casa Branca, Sarah Matthews, que pediu demissão naquele dia. “Foi como dar luz verde àquelas pessoas, de que sua raiva era justificada.”
Em depoimento à comissão, Matthews afirmou ainda que considera 6 de janeiro de 2021 “um dos dias mais sombrios da história da nação, e o presidente Trump o tratou como uma ocasião de celebração”. “Então isso só consolidou minha decisão de renunciar”, declarou.
“Foi um tuíte terrível”, considerou em depoimento em vídeo o ex-advogado da Casa Branca Pat Cipollone. “Fui muito claro sobre ser preciso uma declaração imediata e firme de que as pessoas tinham que ir embora”, afirmou. “Muitos disseram isso, não apenas eu.”
Contudo, durante os 187 minutos, Trump não cedeu aos pedidos feitos por assistentes, aliados, membros de seu governo, parlamentares republicanos e familiares para clamar pelo fim do ataque.
Também não pediu reforços para auxiliar a polícia do Capitólio, nem deu qualquer ordem ao secretário de Defesa, à Procuradoria-Geral ou ao FBI.
A comissão
Em 12 de julho, a comissão parlamentar já havia divulgado um veredicto bastante incisivo sobre o caso, afirmando que Trump “colocou um plano em prática” ao conclamar apoiadores a marcharem rumo ao Capitólio.
“As evidências confirmam que [o episódio] não se tratou de uma chamada espontânea à ação, mas sim de uma estratégia deliberada que o presidente havia decidido de maneira antecipada”, declarou a deputada democrata e membro do comitê Stephanie Murphy.
Uma das evidências é um tuíte de Trump, publicado em 19 de dezembro de 2020, no qual ele diz: “Grande protesto em [Washington] D.C. em 6 de janeiro. Estejam lá! Será selvagem!”
Em junho, a comissão também já havia responsabilizado Trump pelo ataque, classificando os acontecimentos como uma “tentativa de golpe”. Os investigadores argumentaram que a invasão foi resultado de repetidas e infundadas acusações – feitas pelo ex-presidente – de fraude após as eleições presidenciais.
Longe de terminar seus trabalhos, a comissão deve retomar as audiências em setembro.
Trump, que está considerando concorrer à Casa Branca novamente em 2024, criticou a investigação do painel, o qual acusou de propagar “muitas mentiras e deturpações”.
ek/lf (AP, Lusa)