07/04/2021 - 13:22
Você já imaginou passar pela incrível experiência de ser um imperador romano? Ao ouvirem os relatos da vida dos líderes desse grande império nas aulas de história, provavelmente muitos de nós sonhamos com isso. Mas sua opinião mudará completamente depois de conhecer os resultados de um estudo realizado por pesquisadores da USP.
Eles analisaram a trajetória de 175 imperadores romanos e encontraram padrões inusitados usando um modelo estatístico para análise de sobrevivência. Apesar de repleta de riquezas, mordomias e histórias para lá de picantes, a vida desses homens sempre esteve por um fio, suscetível às mais terríveis traições e tragédias que se repetem ao longo do tempo. “Nosso modelo estatístico mostra que a maioria dos imperadores romanos sofreram mortes violentas nos anos iniciais de reinado”, explica o professor Francisco Rodrigues, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos.
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Ele é um dos autores do artigo Power laws in the Roman Empire: a survival analysis (“Leis poderosas no Império Romano: uma análise de sobrevivência”, artigo inédito ainda não revisado por pares), elaborado em parceria com o professor Francisco Louzada, também do ICMC, com o pós-graduando Pedro Ramos e o professor Luciano Costa, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC).
Padrão encontrado
“Ao examinarmos o tempo até a morte violenta dos imperadores, observamos que o risco é alto quando o imperador assume o trono. Esse achado pode estar relacionado às dificuldades para lidar com as demandas que o cargo exige e à falta de habilidade política do novo imperador. Nosso modelo sugere que o risco diminui sistematicamente até atingir 13 anos de governo e, em seguida, aumenta rapidamente”, escrevem os pesquisadores no artigo.
Há várias hipóteses que podem explicar esse ponto de mudança, em que a possibilidade de uma morte violenta volta a crescer. Por exemplo, após esse ciclo de 13 anos, é provável que os antigos inimigos do imperador tenham se reagrupado ou que novos inimigos tenham surgido. O interessante é que o estudo mostra também que, após esse ponto de mudança, o risco volta a diminuir.
Esse padrão encontrado pelos pesquisadores, apesar de parecer aleatório, está relacionado a outros fenômenos como terremotos, flutuações nos preços das ações e ramificações em galhos de árvores. É como se houvesse uma espécie de “lei” regendo a vida e a morte dos imperadores. Os reinados curtos são a regra; a exceção é a ocorrência de um reinado longo.
“Esse comportamento é semelhante ao observado em muitos sistemas, incluindo terremotos, pois grandes terremotos são eventos raros. O resultado sugere que o tempo de vida de um imperador romano até a morte violenta não tem uma escala típica. O Império Romano é, então, um exemplo de sistema que apresenta invariâncias de escala, tal como ocorre com a distribuição de renda na sociedade, o tamanho das empresas e da população nas cidades, bem como a frequência com que palavras aparecem em um texto”, afirmam os autores.
Compreensão quantitativa
Com apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o estudo contribui para lançar um novo olhar para as antigas civilizações, costumeiramente analisadas por historiadores, antropólogos e cientistas sociais, mostrando que essas sociedades também podem ser compreendidas quantitativamente, por meio de modelagem matemática e computacional. “As antigas civilizações são exemplos de um sistema complexo composto por agentes que interagem, colaboram, e competem por poder e recursos”, conforme explicam os pesquisadores.
Talvez, futuramente, esses tempos em que hoje vivemos também possam ser fruto de estudos quantitativos. Que tipo de padrão os cientistas de amanhã encontrarão na nossa civilização? Será preciso esperar milênios para encontrarmos respostas ou as análises do passado também nos servirão, em breve, para prever nossa sobrevivência? Como a ciência é movida mais por perguntas do que por respostas, só podemos afirmar, com certeza, que ainda há muito o que pesquisar para compreendermos as leis que regem nosso mundo.
“O que podemos afirmar é que, tal como nas civilizações antigas, os padrões de comportamento de um grupo podem ser previsíveis e surgem a partir das ações imprevisíveis dos indivíduos. As interações e decisões individuais influenciam a coletividade, criando padrões que afetam todo o sistema”, conclui Rodrigues.