O polvo e a sépia são famosos pelo uso de camuflagem para combinar com a cor do ambiente em que estão. Até recentemente, porém, um terceiro tipo de cefalópode – a lula – nunca havia sido visto exibindo essa habilidade. Agora, em um estudo publicado na revista Scientific Reports, cientistas da Unidade de Física e Biologia da Universidade de Pós-Graduação do Instituto de Ciência e Tecnologia de Okinawa (OIST, no Japão) mostraram que a lula pode fazer isso e se camufla para combinar com um substrato como forma de evitar predadores. Este trabalho abre caminhos de pesquisa sobre como as lulas veem e percebem o mundo ao seu redor. Além disso, lança luz sobre seu comportamento e, portanto, pode ajudar em iniciativas de conservação.

Imagens capturadas na Estação de Ciências Marinhas do OIST mostram que as lulas têm uma incrível capacidade de mudar de cor para combinar com o substrato, a fim de evitar a predação. Crédito: Ryuta Nakajima/OIST

Pela primeira vez no registro científico, lulas foram observadas mudando sua coloração para se misturar ao ambiente. Você pode se perguntar como a comunidade científica demorou tanto para ter um vislumbre desse comportamento, mas quando você vê o quão ele bom é, fica mais fácil entender como ninguém o havia percebido antes.

Elo com recifes de coral

“As lulas costumam se movimentar no mar aberto, mas queríamos descobrir o que acontece quando elas se aproximam um pouco de um recife de coral ou se são perseguidas por um predador até o fundo do oceano”, explicou um dos três primeiros autores, dr. Ryuta Nakajima, pesquisador visitante do OIST. “Se o substrato é importante para a lula evitar a predação, isso indica que o aumento ou a diminuição das populações de lulas estão ainda mais ligados à saúde dos recifes de coral do que pensávamos.”

Estudos anteriores sobre camuflagem de cefalópodes foram realizados principalmente em sépias e polvos. A lula, como um animal que tende a viver em mar aberto, é notoriamente difícil de manter em cativeiro, e por isso tem sido bastante evitada para esse tipo de pesquisa. Mas, desde 2017, os cientistas da Unidade de Física e Biologia do OIST cultivam uma espécie de lula oval em cativeiro.

Essa lula, conhecida localmente como Shiro-ika, é uma das três lulas ovais encontradas em Okinawa. Quando em mar aberto, elas são de cor clara, o que significa que se misturam à superfície do oceano e à luz do sol cintilante acima. Mas os pesquisadores suspeitavam que, quando se aproximassem do fundo do oceano, seria uma história completamente diferente.

Descoberta acidental

Na Estação de Ciências Marinhas do OIST, as lulas ovais foram, quase acidentalmente, observadas camuflando-se no substrato pela primeira vez. Os pesquisadores estavam limpando seu tanque para remover o crescimento de algas. Eles notaram que os animais estavam mudando de cor dependendo de estarem sobre a superfície limpa ou sobre as algas.

Após essa observação, os pesquisadores realizaram um experimento controlado. Eles mantiveram várias lulas em um tanque e limparam metade do tanque, deixando a outra metade coberta de algas. Eles colocaram uma câmera subaquática dentro da água e suspenderam uma câmera comum acima, para que pudessem capturar e executar testes estatísticos em qualquer mudança de cor.

Os resultados foram claros. Quando as lulas estavam no lado limpo do tanque, elas eram da cor clara. Mas quando estavam acima das algas, prontamente se tornavam mais escuras.

O experimento descobriu uma habilidade que nunca havia sido relatada em lulas. Os pesquisadores destacaram que, além de abrir caminhos interessantes para explorar as capacidades visuais do animal, o estudo também mostrou que o substrato é claramente útil para essas lulas sobreviverem.

Efeito impressionante

“Esse efeito é realmente impressionante. Ainda estou surpreso que ninguém tenha notado essa habilidade antes de nós”, disse o coprimeiro autor dr. Zdenek Lajbner, também do OIST. “Isso mostra o quão pouco sabemos sobre esses animais maravilhosos.”

Segundo Nakajima, essa lula em particular é importante para Okinawa por razões econômicas e culturais. “Na verdade, foram os pescadores locais os primeiros a distinguir três espécies de lulas ovais em Okinawa, muito antes dos cientistas”, disse ele.

“Estamos ansiosos para continuar a explorar as capacidades de camuflagem desta espécie e cefalópodes em geral”, disse o prof. Jonathan Miller, investigador principal da Unidade de Física e Biologia do OIST e autor sênior do artigo de pesquisa.