Uma análise dos cérebros de 11 cosmonautas homens que passaram em média cerca de 6 meses no espaço, na Estação Espacial Internacional, não encontrou evidências de que esse longo tempo na microgravidade tenha levado à neurodegeneração. A maioria das mudanças que uma equipe internacional de pesquisadores observou logo após o retorno dos cosmonautas à Terra foi revertida quando seus cérebros foram examinados novamente sete meses depois. Deve-se ressalvar que a recuperação na parte superior do cérebro foi mais pronunciada do que na parte inferior.

Um estudo a esse respeito foi publicado na revista “Science Advances”.

As descobertas fornecem informações sobre como o cérebro se reorganiza durante longos voos espaciais em escala macro e micro, inclusive por meio de mudanças no líquido cefalorraquidiano. As técnicas de neuroimagem, como a ressonância magnética (MRI), permitiram recentemente aos cientistas descobrir mudanças na estrutura e na função do cérebro após o voo espacial, mas ainda existem poucos dados sobre os efeitos de longo prazo. Apesar de alguns estudos anteriores terem medido as alterações macroscópicas do tecido, eles não puderam avaliar as alterações subjacentes na sua microestrutura.

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Para estudar os impactos da viagem espacial no cérebro em maiores detalhes, Steven Jillings, da Universidade de Antuérpia (Bélgica), e colegas da Bélgica, Rússia, Austrália e Alemanha determinaram a fração de substância cinzenta, substância branca e líquido cefalorraquidiano por voxel (um ponto no espaço tridimensional) em uma série de imagens de difusão por ressonância magnética (dMRI) usando uma técnica que depende de cada tipo de decaimento de sinal dMRI exclusivo de cada tecido.

Aumentos e reduções

Jillings e seus colegas usaram essa abordagem para avaliar os cérebros de cosmonautas do Roscosmos, o programa espacial da Rússia, antes e cerca de 9 dias depois de missões espaciais de longa duração na Estação Espacial Internacional com média de 171 dias. Os pesquisadores realizaram varreduras adicionais em oito dos cosmonautas cerca de sete meses após seu retorno.

A equipe detectou aumentos na quantidade de tecido de substância cinzenta por voxel na parte superior do cérebro e diminuições de substância cinzenta nos ventrículos e na fissura de Sylvius (ou sulco lateral, que divide os lobos frontal e parietal do lobo temporal). Mas essas alterações foram na distribuição de tecido causada por mudanças no líquido cefalorraquidiano, e não reduções na quantidade líquida de substância cinzenta.

As mudanças no líquido cefalorraquidiano observadas pelos pesquisadores apoiam observações anteriores de que a microgravidade faz com que o cérebro se desloque para cima dentro do crânio. Além disso, elas sugerem que o cerebelo também se desloca para cima.

Os dados indicam ainda que diminuições maiores na nitidez da visão dos cosmonautas após o voo espacial – um sintoma causado por uma condição chamada síndrome neuro-ocular associada ao voo espacial (SANS, na sigla em inglês) – estão associadas a expansões maiores nos ventrículos cerebrais. Como esse resultado contradiz a descoberta de um estudo anterior, Jillingset e seus colegas consideram que um conjunto de dados maior é necessário para determinar a ligação entre a SANS e as mudanças relacionadas ao cérebro.